
Vou descendo a rua, rumo a uma exposição de fotografia. Enquanto caminho, devagar, vou olhando à volta. Não ando muito naquela parte da cidade. Está diferente, há contraste entre alguns edifícios que tiveram obras e as ruas sujas que são uma eterna praga praga lisboeta.
Gosto de ir observando, ver o que as ruas oferecem. Faço sempre descobertas, andar na rua é ir pesquisando o que está à nossa volta. E há de tudo: objetos abandonados, alguma coisa que espreita de uma janela, o interior de uma casa que se vislumbra, uma sombra que se projeta com a luz rasante do fim do dia, cabos fora das paredes a fazerem teias de aranha eletrónicas, o complemento moderno da paisagem urbana contemporânea. Descontrai-me andar assim, sobretudo nestes dias de final de primavera, quando as tardes começam a espreguiçar-se.
De vez em quando paro e fico a olhar com mais atenção. Muitas vezes penso que as paredes falam — nas cores desbotadas que parecem uma maquilhagem esborratada, nas imperfeições da textura, paredes que também são folhas soltas que recolhem as frases que alguém lá colocou.
De repente vejo uma frase solta, cuidadosamente desenhada dentro de um balão, como se fosse uma banda desenhada em que um personagem deixa alguma coisa dita. À minha frente vejo uma grelha que solta uma exclamação — parece mesmo que está a conversar com quem passa — e o tema da conversa é o relato do que se vai passando neste retângulo à beira-mar plantado. Olho para o que está escrito e penso que aquelas palavras, estas que aqui deixo na fotografia, são uma boa observação sobre o resultado das eleições de há poucos dias.
Leio a parede: “Estou com falta de ar.” Eu também, quando olho à volta para o meu país. A falta de ar veio só dos resultados eleitorais? Imagino que para outras pessoas possa ser o que sentiram no final da Taça. Ou simplesmente a sensação de angústia por tudo o que falta fazer para sermos um país melhor. Falta de ar, uma boa síntese do sentimento no final deste mês de maio.
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