
“A Perturbação de Jogo Digital (Gaming Disorder) aplica-se apenas quando há impacto funcional significativo, perda de controlo e persistência dos sintomas por mais de 12 meses”, explicam investigadores do Ispa – Instituto Universitário – Centro de Investigação APPsyCI – Applied Psychology Research Center Capabilities & Inclusion. David Dias Neto liderou um estudo, com a doutoranda em Psicologia Cátia Martins, no qual identificaram quatro perfis psicológicos de jogadores: Envolvido (38,95%), Relacional (26,01%), Evitante (20,16%) e Desregulado (15,78%).
O primeiro, o Envolvido, diz respeito a jogadores emocionalmente equilibrados, com integração positiva dos videojogos na sua vida social. O Relacional predomina entre jovens e pessoas não-binárias, com elevada motivação social e alguma dificuldade na regulação emocional.
O Evitante, por sua vez, diz respeito jogadores mais velhos, com boa regulação emocional e motivações centradas no lazer. Por fim, o Desregulado é dos jovens, maioritariamente do sexo masculino e com baixos níveis de escolaridade, que apresentam sérias dificuldades emocionais, motivações escapistas e uso problemático. Estes são os que apresentam maior risco de desenvolver perturbação de jogo digital, segundo critérios da OMS.
“Ao contrário das dependências com substância (como o álcool ou a nicotina), as dependências comportamentais, como o uso problemático de videojogos, não envolvem ingestão de químicos, mas podem ter efeitos semelhantes ao nível da saúde mental, do funcionamento social e do sistema de recompensa cerebral”, realçam.
Este estudo é o primeiro a integrar, de forma sistemática, 25 variáveis psicológicas, incluindo 19 motivos para jogar e 6 dimensões de regulação emocional, abrangendo três géneros (masculino, feminino e não-binário) e diferentes estilos de jogo. Os resultados permitem identificar quem corre risco de desenvolver um uso disfuncional dos videojogos e quem faz um uso positivo e socialmente integrado.
“É fundamental diferenciar envolvimento saudável de comportamentos problemáticos, para que se possa intervir atempadamente e promover a literacia emocional e digital, sobretudo entre os mais jovens”, afirma David Dias Neto.
O estudo reforça a necessidade de se desenvolver programas de prevenção personalizados, especialmente para adolescentes e jovens adultos em risco. Refere-se, ainda, a formação dos profissionais de saúde mental e educadores, com ferramentas para distinguir entre uso intenso e uso problemático. Os investigadores acrescentam a necessidade de se compreender o papel do design digital (ex. loot boxes, notificações, recompensas variáveis) na promoção de comportamentos aditivos, assim como evitar estigmatização dos jogadores, reconhecendo que a maioria faz um uso saudável e positivo dos videojogos.
O estudo foi publicado em duas revistas científicas internacionais, a Journal of Behavioral Addictions e a Addictive Behaviors.
Maria João Garcia
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