
“O regime de licenciamento dos laboratórios clínicos em Portugal está desajustado da realidade, é burocraticamente excessivo e injusto para os operadores privados, ameaçando assim a continuidade dos serviços prestados à população.” A conclusão é estudo comparativo europeu e de um inquérito nacional, promovido pela ANL.
A associação alerta, em comunicado, para a urgência de simplificar e desburocratizar o licenciamento. “Esta necessidade torna-se ainda mais crítica perante o congelamento de preços convencionados há mais de uma década, a obsolescência da tabela de atos e a inexistência, já criticada pelo European Centre for Disease Prevention and Control da União Europeia, de uma estratégia nacional que integre eficazmente os laboratórios privados nos planos de preparação e resposta a emergências de saúde pública”, enfatiza.
Conforme explica Nuno Marques, diretor-geral da ANL: “estamos a falar de um setor que está na primeira linha do diagnóstico, que alivia o SNS diariamente e que garante acesso em todo o território. Mas está a ser asfixiado por regras injustas, custos desnecessários e um modelo que não reconhece o seu verdadeiro valor para a saúde pública”.
Tendo por base os resultados analisados no estudo comparativo europeu e no inquérito nacional aos seus associados, a ANL propõe uma reforma estrutural do regime de licenciamento, alinhada com as melhores práticas europeias. Defende, também, a adoção do licenciamento por comunicação prévia com fiscalização a posteriori, o reconhecimento automático de laboratórios acreditados com normas ISO 9001 ou 15189 e a simplificação dos procedimentos.
A Associação sugere, ainda, a simplificação do regime dos postos de colheita, a modulação das taxas regulatórias, bem como a integração efetiva dos laboratórios privados nos planos nacionais de emergência em saúde pública.
Portugal entre os mais burocráticos e desajustados da União Europeia
O estudo comparou também o regime português de licenciamento com os modelos em vigor em países como Espanha, França, Alemanha, Bélgica, e também do Reino Unido, e concluiu que Portugal adota um dos enquadramentos “mais rígidos e desajustados” da União Europeia. “Entre as principais fragilidades identificadas destaca-se a existência de exigências técnicas desproporcionadas face ao risco real das atividades laboratoriais, como a obrigatoriedade de instalar sistemas de pressão negativa mesmo em laboratórios de baixo risco (NSB1 e NSB2)”, informa o comunicado.
Continuando: “A legislação portuguesa impõe, ainda, critérios físicos rígidos (como a exigência de uma área mínima de 120 m²) e uma compartimentação excessiva dos espaços, privilegiando requisitos estruturais em detrimento da adoção de protocolos funcionais e eficazes de garantia da qualidade.”
No estudo verificou-se que cerca de 70% dos inquiridos consideram o regime inadequado ou excessivamente exigente, enquanto 90% classificam a exigência de 120 m² mínimos como arbitrária ou desnecessária. Adicionalmente, 75% apontam a existência de exigências documentais redundantes no processo e apenas 30% reconhecem que a atuação da Entidade Reguladora da Saúde (ERS) tem contribuído para a melhoria da qualidade dos serviços laboratoriais. De forma unânime, todos os laboratórios consideram que o atual regime favorece injustamente as unidades do setor público e as Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS), em detrimento dos operadores privados.
Verifica-se, ainda, a ausência de mecanismos de “deferimento tácito” e “um excesso de intervenções burocráticas” por parte das entidades públicas. “Tudo isto configura um regime mais exigente, mas que não se traduz em melhores resultados, ao contrário do que acontece noutros países europeus, onde se privilegiam certificações voluntárias, responsabilidade técnica e fiscalização orientada para resultados.”
Para a ANL, face a estas conclusões, o modelo revela-se “incompatível com a agilidade e eficiência que o setor da saúde exige”, especialmente em contextos de crise sanitária ou emergência epidemiológica.
Maria João Garcia
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