Há uma revolução em curso no mundo digital. Não se trata de um novo algoritmo disruptivo ou de uma ferramenta movida a inteligência artificial generativa. Trata-se de algo mais profundo e, talvez por isso, mais silencioso: uma transformação no modo como desenhamos as nossas interações com a tecnologia. Num ecossistema digital cada vez mais saturado de funcionalidades sofisticadas e interfaces deslumbrantes, a simplicidade, a acessibilidade e a empatia emergem como as verdadeiras inovações do nosso tempo.

Durante décadas, o design digital foi impulsionado por uma lógica estética muitas vezes autocentrada, em que a beleza visual e a complexidade técnica eram confundidas com valor. A prioridade era impressionar, mesmo que à custa da usabilidade. Agora, esse paradigma está a ser desafiado. E não apenas por exigência legal — embora a Estratégia Digital 2030 da Comissão Europeia, com o seu foco explícito na acessibilidade, desempenhe um papel catalisador importante —, mas por uma nova consciência ética e funcional que começa a infiltrar-se nas equipas de produto, desenvolvimento e design.

No centro desta mudança está uma ideia simples, mas poderosa: os produtos digitais devem ser compreensíveis, utilizáveis e úteis para todos, incluindo os milhões de cidadãos que não dominam a linguagem digital ou que enfrentam barreiras cognitivas, motoras ou visuais no seu dia-a-dia online.

Os dados não mentem: segundo um recente Relatório da Sociedade Digital da Fundação Telefónica, apenas 43% das pessoas com mais de 65 anos usam aplicações móveis de forma autónoma, e 42% reconhecem sentir stress ou insegurança ao interagir com estes sistemas. Esta não é apenas uma estatística — é um alerta sobre a exclusão tecnológica silenciosa que persiste mesmo em sociedades digitais avançadas.

É neste contexto que começam a emergir departamentos ou empresas especializadas em soluções inclusivas. Estes departamentos em agências de consultoria ou as empresas especializadas, tem de ter como princípio orientador que: um bom design não se vê, sente-se. Deve reduzir a frustração, promover a autonomia e criar um ambiente digital onde todos se sintam bem-vindos. Isso significa interfaces limpas, linguagem direta, navegação intuitiva e atenção rigorosa à carga cognitiva do utilizador.

Curiosamente, esta procura pela clareza não limita a criatividade — redefine-a. A verdadeira inovação está agora em resolver problemas reais, não em ostentar camadas de complexidade desnecessária. O design inclusivo é, neste sentido, um retorno ao essencial: um produto é bem desenhado quando resolve, com simplicidade e elegância, uma necessidade concreta.

Mais do que uma tendência ou uma resposta regulatória, a acessibilidade digital tornou-se uma condição de legitimidade tecnológica. Ignorá-la é arriscar irrelevância. Integrá-la, desde a génese dos projetos, é sinal de maturidade. Porque já não basta criar para os mais ágeis, os mais letrados ou os mais jovens. O futuro digital pertence a todos — ou não será futuro.

A pergunta que se impõe agora é estratégica: estaremos dispostos a redesenhar não só os nossos produtos, mas também os nossos critérios de sucesso?

Num mundo que se quer cada vez mais automatizado, é a empatia que pode fazer a diferença. Não há progresso digital sem humanidade. E, no design, como na vida, menos é, de facto, mais — quando esse “menos” é pensado para incluir.