Depois da tempestade, nem sempre vem a bonança. O Banco de Portugal (BdP) voltou a registar perdas operacionais no ano passado, no valor de 1142 milhões de euros, pressionado pela política monetária europeia. A subida rápida das taxas de juro afetou fortemente a margem financeira da instituição, tal como já tinha acontecido no ano anterior.

O resultado operacional negativo foi, no entanto, compensado por provisões acumuladas pelo BdP no passado para riscos gerais, o que culminou num resultado antes de impostos nulo. Após o reconhecimento de ativos por impostos diferidos, o resultado líquido foi positivo em 1,5 milhões de euros.

Em 2022, quando a instituição registou uma quebra acentuada de 42% nos lucros, para os 297 milhões de euros, Mário Centeno sinalizou que se avizinhava um ciclo de resultados negativos devido ao aumento das taxas de juro e da inflação. E, no ano seguinte, veio a confirmação de uma perda operacional de 1054 milhões.

Os resultados negativos acabaram por ser amparados pela almofada financeira que o BdP vinha a constituir há anos. Contudo, quando ouvido no Parlamento sobre a atividade e as contas do banco central, em junho do ano passado, o governador antecipou aos deputados o prolongamento dos prejuízos por mais dois anos, ou seja, até 2026.

Mário Centeno assegurou que as provisões acauteladas pela instituição serão suficientes para cobrir tais perdas. O Relatório do Conselho de Administração, divulgado esta quarta-feira, revela que o BdP dispõe ainda de 1715,7 milhões de euros de provisões, após ter utilizado 1141,9 milhões durante o ano passado para compensar o resultado operacional negativo.

O resultado do banco central em 2024 foi pressionado sobretudo pela margem financeira, que foi de 573 milhões negativos. Esta evolução deve-se essencialmente ao desfasamento entre os rendimentos dos ativos - muitos com taxas fixadas em períodos de juros baixos - e os encargos com os passivos, que aumentaram com a subida rápida das taxas de juro diretoras do Banco Central Europeu (BCE).

Em particular, os juros pagos sobre os depósitos das instituições de crédito e de outros passivos remunerados ultrapassaram largamente os rendimentos gerados pelos ativos do banco central, resultando num impacto negativo sem precedentes nas contas da instituição.

Apesar do contexto adverso, os gastos administrativos mantiveram-se sob controlo, ainda que com um ligeiro aumento: 213 milhões de euros, o que representa um acréscimo de 7,8% face a 2023. Segundo o banco central, o crescimento foi motivado pelo aumento das despesas com pessoal e do investimento na modernização tecnológica do banco.

No seu conjunto, o balanço do BdP cresceu para cerca de 191 mil milhões de euros, mais 6 mil milhões do que no ano anterior. Este aumento refletiu, principalmente, a valorização do ouro e as variações cambiais favoráveis. Por outro lado, o valor total foi atenuado pelo fim dos empréstimos de longo prazo aos bancos e pela redução dos títulos adquiridos no âmbito da política monetária do BCE.

Durante a apresentação do relatório, a vice-governadora do banco central, Clara Raposo, adiantou que o resultado operacional em 2025 será "claramente negativo", mas "substancialmente inferior" ao do ano passado. Por sua vez, Mário Centeno acrescentou que, atendendo à necessidade de constituir uma almofada financeira para o futuro, não se espera qualquer distribuição de dividendos (ao Estado) tão cedo.