
Quatro épocas, um título e um legado de jovens talentos para o futuro do Sporting Clube de Braga. Não há melhor forma de descrever a história de Carlos Carvalhal com o clube da sua terra.
Ao longo dessas épocas, e principalmente desde a sua segunda passagem, Carlos Carvalhal não só deixou a sua marca no clube através de conquistas significativas, mas também moldou o futuro do futebol bracarense ao lançar e desenvolver jovens talentos da formação. A sua jornada no comando técnico dos bracarenses é marcada por momentos de glória, desafios superados e um impacto duradouro que ultrapassa os resultados imediatos.
Desde o seu regresso ao clube, Carvalhal demonstrou uma capacidade assinalável de transformar adversidades em oportunidades, construindo equipas coesas e competitivas mesmo em circunstâncias desafiadoras.
O início como treinador e o feito em Matosinhos
Tendo começado a sua carreira como treinador no SC Espinho, na época de 1998/99, seguido de passagens por Freamunde, Vizela e CD Aves, antes de chegar a Matosinhos, em 2001, para orientar o Leixões, na altura a competir na Segunda Divisão B (atual Liga 3).
Com os Bebés do Mar, apesar de por pouco não conseguir a subida à Segunda Liga (ficou empatado com o primeiro classificado, perdendo apenas no confronto direto), conseguiu com um trajeto impressionante, guiar a equipa até a final da Taça de Portugal, onde foi derrotada pelo Sporting, 1-0.
Com isto, a equipa leixonense ficou apurada para a Taça UEFA (atual Liga Europa) da época seguinte.
Apesar de disputar o terceiro escalão, a formação de Matosinhos passou mesmo a fase de qualificação, ao eliminar o FK Belasica, da Macedónia do Norte, com um agregado de 4-3, após um empate a dois golos em Matosinhos e uma vitória por duas bola a uma na Macedónia do Norte. Na ronda seguinte, foi eliminado pelos gregos do PAOK, ainda assim, venceu 2-1 na primeira mão, no Estádio do Mar. Contundo, na segunda mão, não conseguiram fazer frente ao poderio dos gregos e foram derrotados por quatro bolas a uma.
Findada a campanha europeia, Carlos Carvalhal guiou a equipa a uma campanha imaculada no campeonato, ficando em primeiro lugar e garantindo a subida à Segunda Liga. Em 38 jogos viu a equipa conquistar 92 pontos, 22 a mais que o segundo classificado, o Lousada.
Após o sucesso em Matosinhos, seguiu-se o Vitória FC, que após descer de divisão na época 2002/03, procurava subir logo de volta ao principal escalão e viu em Carlos Carvalhal o homem para liderar a equipa a esse objetivo.
E essa decisão viu-se acertada, com os sadinos a acabarem em segundo lugar e a subirem logo imediatamente à Primeira Liga, tendo conquistado 64 pontos, ficando seis pontos acima da primeira equipa não promovida e a três do primeiro lugar, ocupado pelo Estoril.
Depois de Setúbal, seguiu-se Belém e os Belenenses, onde na primeira temporada guiou os azuis do Restelo a um tranquilo nono lugar na Primeira Liga, não ficando longe dos lugares europeus. Contudo, na época seguinte não conseguiu replicar os mesmos resultados e saiu após nove jogos.
No verão de 2006, abraçou o maior projeto da carreira, o de treinar o clube da sua terra, o SC Braga, onde apesar de um início prometedor, não conseguiu dar sequência e acabou por sair ao fim de 13 jogos, onde somou seis vitórias, dois empates e cinco derrotas. Nesta temporada, orientou ainda o Beira-Mar em seis jogos, vencendo apenas um, empatando dois e perdendo três.
Na sequência deste ano menos bom, Carvalhal voltou a Setúbal, onde seria responsável por uma temporada histórica para os sadinos. Neste ano além de guiar ao sexto lugar, e consequente qualificação europeia, liderou a formação vitoriana até á final da Taça da Liga onde chegou após um percurso invicto até lá. Na final após um nulo no marcador, viu Eduardo ser herói ao defender três penaltis e a garantir que a Taça ia para Setúbal.
O treinador minhoto após esta época histórica mudar-se-ia para o Asteras Tripolis, da Grécia, e depois Marítimo, onde não teria grande sucesso.
Na época 2009/10 viria o maior desafio da carreira com o Sporting a bater à porta, assumindo o comando técnico dos leões, à 11.ª jornada, com a equipa em sexto lugar. Guiou a equipa até ao quarto lugar, ficando a 20 pontos do pódio. Além disso viu a equipa chegar aos oitavos de final da Liga Europa, onde foi eliminado em virtude dos golos fora, às mãos do Atlético de Madrid. Alcançou ainda as meias finais da Taça da Liga e os quartos de final da Taça de Portugal. Em 33 jogos, ganhou 16, empatou sete e perdeu 10.
Após uma passagem aquém do esperado, seguiram-se novas aventuras pelo estrangeiro, nomeadamente Turquia, onde passou por Besiktas e Istambul BB, seguindo-se depois uma passagem pelos Emirados Árabes Unidos, como coordenador técnico do Al Ahli Club.
Em 2015 assume o comando técnico dos ingleses do Sheffield Wednesday, no segundo escalão, onde guia os owls a um sensacional sexto lugar, garantindo lugar nos playoffs de subida à Premier League. Nos playoffs após ultrapassar o Brighton, foi derrotado pelo Hull City na final, vendo assim negada a possibilidade de subir de divisão. Viu ainda a equipa realizar uma bela campanha na Taça da Liga, chegando aos quartos de final, caindo apenas aos pés do Stoke City.
Na temporada seguinte, conseguiu ficar em posição semelhante, um quinto lugar e novo acesso aos playoffs de subida, mas desta vez não conseguiu passar da meia final, onde foi eliminado pelo Huddersfield nos penaltis.
Em 2017/18, contudo, não foi capaz de dar seguimento ao mesmo sucesso, tendo saído à 23.ª jornada com a equipa em 15.º lugar.
Nessa mesma época, e como reconhecimento do trabalho nos anos anteriores, teve a oportunidade de treinar na Premier League, ao serviço do Swansea. Em 25 jogos ao serviço da equipa galesa, conseguiu dar esperanças de manutenção a uma equipa que estava em último e que parecia condenada à despromoção, mesmo que no final tenha mesmo sido despromovida, ficando a três pontos da salvação. Guiou ainda os swans até aos quartos de final da Taça de Inglaterra. Em 25 jogos viu a sua equipa ganhar oito, empatar oito e perder nove.
Tendo saído de Inglaterra após a temporada acabar, um ano depois voltou a Portugal para o Rio Ave. Ao leme dos vilacondenses, comandou a equipa a um excelente quinto lugar, com 55 pontos, garantindo a qualificação europeia da equipa rioavista.
A excelente época ao serviço da formação de Vila do Conde, valeu-lhe o regresso a Braga, onde desta vez as coisas foram diferentes, mas para melhor. No regresso a casa, não só conseguiu garantir o objetivo do quarto lugar, como conseguiu a certo ponto, dar luta pelo pódio. Para coroar a temporada de regresso, guiou os bracarenses à conquista da Taça de Portugal, derrotando o Benfica 2-0 na final.
Na segunda temporada em Braga, viu a equipa terminar no mesmo lugar no campeonato, mas o grande destaque vai para a bela campanha europeia dos arsenalistas, onde na Liga Europa foram até aos quartos de final, onde só caíram no prolongamento frente ao Rangers, da Escócia.
Após duas épocas em Braga, seguiu-se nova aventura no estrangeiro, primeiro nos Emirados Árabes Unidos, para comandar, ainda de que forma breve, o Al-Wahda. Posteriormente, na mesma temporada, assumiu o Celta de Vigo, de Espanha, onde conseguiu a manutenção, conseguindo um 13.º lugar. Em 29 jogos ao comando dos galegos, ganhou 10, empatou oito e perdeu 11.

Não ficando em Espanha, partiu para novo destino estrangeiro, mas desta vez, para regressar à Grécia, assumindo o comando técnico do Olympiacos, onde só duraria 11 jogos antes de sair.
Quando menos se esperava, logo após o início da temporada, assumiu de novo os destinos do Braga, onde depois de uma primeira volta conturbada, comandou a equipa uma bela recuperação na segunda volta, chegando mesmo a disputar um lugar no pódio até ao fim do campeonato. Na terceira passagem pelo banco bracarense, Carlos Carvalhal em 50 jogos, viu a equipa ganhar 28, empatar 10 e perder 12.
O técnico de 59 anos viu confirmada a sua saída do SC Braga no final desta temporada, não se sabendo qual o próximo destino do treinador.
Perfil de Carlos Carvalhal
Descrito como um profissional excepcional e um ser humano notável, tanto no âmbito pessoal como profissional. Conhecido por sua dedicação e paixão pelo Sporting Braga, Carvalhal é visto como alguém que prioriza o clube acima de interesses pessoais, recusando propostas mais vantajosas para permanecer na equipa. Rui Casaca, amigo e colega de longa data, destaca a sua competência e preocupação com a cidade e o clube, afirmando que «é uma pessoa que se preocupa com a sua cidade e com o seu clube, mas que aporta a isso tudo uma competência que tem, que construiu ao longo da sua carreira e que é reconhecida quer nacional, quer internacionalmente».

Além disso, Carvalhal é elogiado pelo seu trabalho meritório e capacidade de aproveitar jogadores da formação, integrando-os na equipa principal, como exemplificado pelo caso do jogador Afonso Patrão, que foi aposta na equipa principal com apenas 17 anos. «O Carlos, e só ele é que faz isso no Sporting Braga, porque não acredito que qualquer outro treinador, nem para trás, nem para a frente, faça aquilo que ele fez, no aproveitamento de tudo aquilo que é jogadores da formação, e veja-se que há jogadores, como o caso do [Afonso] Patrão, que com 17 anos nunca jogou, ou praticamente não jogaram na equipa B ou sub-23, mas ele trouxe-os para a equipa principal».
A sua mais recente passagem pelo Braga é vista como um desafio que ele aceitou com determinação, conseguindo reverter uma situação difícil e levar o clube à Liga Europa, apesar das limitações do plantel herdado.
A ligação especial de Carlos Carvalhal a Braga
Carlos Carvalhal teve três passagens pelo SC Braga, cada uma com seus desafios e conquistas. Na primeira passagem, durante a temporada 2006/07, Carvalhal não conseguiu comprir com as expectativas e saiu ao fim de 13 jogos.
A segunda passagem de Carvalhal pelo Braga, nas temporadas 2020/21 e 2021/22, foi marcante. Nesse período, ele conquistou uma Taça de Portugal, terminou em 4.º lugar na liga em ambas as temporadas e levou o clube aos quartos de final da Liga Europa na segunda temporada. Estes resultados consolidaram sua reputação como um treinador competente e capaz de elevar o desempenho do clube.
A terceira passagem de Carvalhal pelo Braga, na temporada 2024/25, foi marcada por desafios significativos. Como afirma Rui Casaca, Carvalhal recebeu um «presente envenenado» ao assumir o comando do clube já durante a época. «Mas, entretanto, foi-lhe passado todo um trabalho e todo um plantel que não tinha sido escolhido por ele. Dentro das suas ideias de jogo, dentro daquilo que ele pretende para as suas equipas. O trabalho da primeira parte da época não foi um trabalho fácil, foi um trabalho muito difícil».

Rui Casaca destaca que Carvalhal aceitou o desafio apesar das dificuldades, dizendo «Entregaram quase que um presente envenenado ao Carlos no início, mas sabendo-se e conhecendo o Carlos, ele aceitaria». Esta terceira passagem foi caracterizada por um trabalho árduo para remodelar a equipa durante a temporada, resultando em um desempenho impressionante na segunda metade da temporada, com o Braga a acabar em 4.º lugar na liga, chegando até a lutar pelo pódio, e a garantir acesso à Liga Europa.
Rui Casaca também faz uma comparação interessante entre Carvalhal e Manuel Cajuda, treinador que marcou uma era na história do Braga, tal como fez questão de relembrar: «Eu lembro-me, por exemplo, do [Manuel] Cajuda que esteve aqui e que chegou a levar o clube na altura à Europa em situações de grande dificuldade, com salários em atraso, com condições muito adversas, e eu valorizo muito isso». No entanto, destaca que Carvalhal trouxe uma competência e um conhecimento profundo do clube e da cidade, o que permitiu um trabalho excepcional. Casaca menciona «O trabalho que ele faz é um trabalho excepcional, é um trabalho que é feito por ele neste clube, e que dificilmente é suportado por outro treinador qualquer. Ele tem a noção exata do que é o clube e o que o clube representa para a cidade, e não é fácil que qualquer outro treinador tenha esse sentimento».

Por fim, Casaca não hesita em afirmar que Carvalhal é o melhor treinador da história do Braga. Ele reconhece os recordes estabelecidos por Carvalhal, principalmente o de maior número de vitórias, e a dificuldade em superá-los. Casaca afirma «Eu respeito muito a história dos clubes. E respeito toda a gente que esteve no clube. […] Os recordes são sempre para bater e se calhar alguém poderá aparecer para bater este recorde, mas é um recorde que não é fácil de bater».
Os recordes e conquistas de Carvalhal são resultado de anos de trabalho árduo e dedicação ao clube. Casaca expressa sua satisfação em ver Carvalhal na história do Sporting Braga, dizendo: «Fico muito contente por ele ficar no registro e na história do Sporting de Braga. Para quem é da Braga é uma menção muito honrosa».