— Em 20 anos de carreira, 13 dos quais em Portugal, jogou sete no Benfica, foi campeão quatro vezes, e quatro no FC Porto, tendo aí ganho o campeonato em duas. Amanhã vai disputar-se um clássico, na Luz, a contar para a 4.ª jornada da Liga Betclic. Estes jogos, mesmo só para a época regular, são sempre especiais?
— Claro! São aqueles encontros que assim que sai o calendário qualquer atleta de uma equipa ou outra faz logo um circulozinho à volta da data para saber quando é. São jogos em que todos querem disputar e viver, mesmo jogando fora, em casa ou em campo neutro, se for o caso de uma Taça. E que sejam equilibrados e competitivos. E, se jogarmos bem, é a cereja do topo do bolo.
— Até porque atuou num e noutro clube e em momentos diferente mesmo em cada um, preparava-se especialmente quando ia defrontar a equipa onde já jogara?
— Sim e não. Sim, porque havia aspectos que preparava de maneira diferente. Sabia um bocado o estilo de jogo do adversário, conhecia alguns jogadores… Não porque a preparação vinha sempre, de uma forma geral, contra todas as equipas. Tinha noção do que é que era e não era capaz de fazer, por isso nunca fugia muito do meu estilo de jogo: físico, rápido, atlético e intenso. E então quando era para estes encontros especiais, tentava sempre elevá-lo.
Mas, é claro que quando conheces o adversário tão bem, quando a motivação é extra, tem-se sempre algo mais do que um simples jogo, simples vitória ou derrota. Acabas por preparar-te um bocadinho melhor, estar mais concentrado nas séries de lançamento ao longo da semana. Se vais jogar fora, começas a visualizar como é o público, as tabelas… Tinha noção de como preparar-me para diferentes alturas quando se tratava de um clássico.
Fico alterado. Quando vejo coisas tão simples que se podem fazer no jogo, os atletas complicam. Custa-me mais agora do que na altura. Quando estava a jogar ou no banco sofria, mas era um sofrimento diferente.
— Deixou o basquete há seis épocas. Sente saudade desses tempos?
— Muitas! Muitas! Para mim ainda estava a jogar, como é óbvio. Sinto muita falta de treinar, das rotinas, do balneário, daquele processo que passava durante o verão para me preparar para a pré-época. Depois conhecer alguns colegas novos e a época rolar. Mas, sobretudo das competições, as Taças da Liga, a Taça de Portugal, o play-off… Tenho saudades desses momentos.
— Vejo-o regularmente nos pavilhões. Ainda lhe suam as mãos quando estás a assistir a uma partida mais intensa?
— Sim. Fico alterado. Quando vejo coisas tão simples que se podem fazer no jogo, os atletas complicam. Custa-me mais agora do que na altura. Quando estava a jogar ou no banco sofria, mas era um sofrimento diferente. Agora é um feeling de incapacidade de contribuir ou de falar com os jogadores, explicar-lhes e para além de tudo demonstrar-lhes. Agora não tenho esse poder. Antes tinha, sobretudo podia demonstrar. Walk the talk, como se chama dizer.
— Está a pensar ir ver o clássico?
— Sim, fui convidado pelo patrocinador para assistir num daqueles sofás junto ao campo.
— Ambas as equipas estão invictas. Dá favoritismo a alguém?
— Pelo que vejo do plantel, o Benfica a jogar em casa poderia ser, mas, pelo que nos tem demonstrado nos últimos anos, esta ainda não é a fase em que está mais forte. É mais lá para o final da época. Perderam três elementos muito importantes: o Toney Douglas, que está no FC Porto, o Terrell Carter e o Ivan Almeida. Eram jogadores que já conheciam a Liga e os clássicos. A estes novos vou-lhes dar o benefício da dúvida, mas não sei.
O FC Porto costuma estar sempre melhor nestes inícios da época. Posso dizer que vai ganhar o Sporting…? [risos]. Não sei, não consigo escolher, talvez o Benfica porque estará em casa.
Houve uma química especial, uma sinergia entre os atletas, o Miguel Miranda, o João Santos, o Zé Costa, o Nuno Marçal…
— Ganhou dois títulos no FC Porto [2002/04 e 2010/11] e quatro no Benfica [2012/13, 2013/14, 2014/15, 2016/17], consegues destacar um em cada clube que o tenha marcado mais?
— Sim. Talvez o meu segundo no FC Porto. Foi mais especial do que o primeiro, porque o Moncho López foi um treinador especial para mim. Deu-me a responsabilidade de eu ser o líder. Quer eu como o [Gregory] Stempin éramos os jogadores referencia da equipa, por isso foi aquele título em que achei que tinha um alvo nas costas e toda a gente me queria tirar esse título. Mas gostei de como mantive o nível toda a época, de como fui o líder no balneário. Houve uma química especial, uma sinergia entre os atletas, o Miguel Miranda, o João Santos, o Zé Costa, o Nuno Marçal… estou-me a lembrar de vários atletas. Houve ali muita química.
O outro título que ganhei no FC Porto tinha vindo dos Estados Unidos e ainda estava a tentar firmar-me, tinha bastantes estrelas na equipa. Sei que tive um papel muito importante nos play-offs, mas parecia que estava a tentar ganhar o meu espaço e soube-me pouco. Depois, na temporada a seguir, no Queluz, inverteu-se tudo. Se não me engano, até fui o MVP português da Liga. Também foi um título que me marcou, talvez até o título que me marcou mais.
Talvez só esteja um bocadinho triste com a direção [do Queluz], que poderia ter assinalado os 20 anos [2004/05] em que ganhámos o título
— E agora com o regresso do Queluz à Liga esta época, está satisfeito?
— Sim, claro. Estou super contente. Principalmente pelos adeptos que merecem e vão comparecer como vinham a fazê-lo já na Proliga e faziam a festa. Talvez só esteja um bocadinho triste com a direção, que poderia ter assinalado os 20 anos [2004/05] em que ganhámos o título e os atletas pudessem comparecer, não é? Gostava muito de ter ido ao primeiro jogo, mas irei ver outros jogos.
— E dos quatro título no Benfica, qual foi o que o marcou mais?
— Talvez o último, 2016/17, por todas e mais algumas razões. Foi um ano bastante difícil, com lesões, combatemos muitas guerras, muitos egos no balneário. Lembro-me perfeitamente. Foi um ano em grande.