Em declarações à margem de uma visita a Itália, o chefe da diplomacia portuguesa, questionado sobre a ameaça de Donald Trump de impor tarifas comerciais também à UE, reafirmada na sua intervenção na véspera perante o Fórum Económico Mundial de Davos, observou que, por regra, os Estados Unidos são protecionistas da sua economia e o bloco europeu já teve de lidar com esta situação, tanto no primeiro mandato de Trump como no do ex-Presidente Joe Biden.
"A política tarifária é competência exclusiva da União Europeia mesmo, e em particular da Comissão. Mas obviamente que olhamos com preocupação [para esta situação], mas também sem dramas, porque já no primeiro mandato do Presidente Trump houve esta questão e, para dizer a verdade, com o Presidente Biden, o 'Inflation Reduction Act' [Lei da Redução da Inflação, promulgada em 2022] foi muito, muito complicado para a União Europeia e obrigou a negociações grandes", assinalou.
Comentando que "às vezes tem-se a ideia de que as coisas mudam radicalmente", Paulo Rangel notou que, "na verdade, obviamente que os Estados Unidos têm uma proteção da sua economia", independentemente das administrações, "embora com políticas diferentes, isto é, mexendo em instrumentos diferentes", que "não deixam de ter impacto sobre a UE, que é um parceiro comercial fundamental dos EUA, e um impacto grande".
"Portanto, vamos ter de lidar com isso a nível europeu. Já há muitas soluções em estudo, mas evidentemente que, quando surgir essa medida e com o seu exato recorte, haverá uma reação e uma negociação, não tenho dúvidas sobre isso, porque foi aquilo que aconteceu no passado, nos últimos dois mandatos, com presidentes muito diferentes", disse, reforçando que espera "uma negociação intensa com os Estados Unidos no sentido de procurar soluções que beneficiem as duas partes e que, portanto, não sejam lesivas apenas para um".
Na sua intervenção de quinta-feira, por videoconferência, no Fórum de Davos, Trump, disse aos líderes empresariais para fabricarem os seus produtos nos Estados Unidos, caso contrário "terão de pagar tarifas", e dirigiu críticas à União Europeia, queixando-se dos fardos regulatórios de Bruxelas e também do que disse ser o tratamento "muito, muito injusto" que é dado aos Estados Unidos.
Já sobre a pressão de Trump para que o Presidente russo, Vladimir Putin, negoceie um acordo de paz com a Ucrânia para pôr fim à guerra, incluindo a ameaça da véspera de impor sanções a Moscovo caso não se sente à mesa das negociações, Paulo Rangel observou que "o Presidente Trump, ainda enquanto candidato, deu sinais muito claros de que iria ser muito rápido na construção de uma negociação", mas enfatizou que o desfecho desta tem de respeitar o direito internacional.
O ministro dos Negócios Estrangeiros considerou que "é positivo" que haja negociações, "desde que elas respeitem os princípios fundamentais, especialmente na solução final", e "mediadas por quem tem a capacidade para o fazer, mas com a intervenção de todos aqueles que são de uma forma ou outra afetados ou que sofrerão consequências dessas negociações".
"Agora, é preciso ver qual é o resultado final. Tem de ser um resultado que salvaguarde o direito internacional, isso é muito importante, e nomeadamente que salvaguarde princípios da Carta das Nações Unidas", sublinhou.
Trump, que prometeu acabar com a guerra em 24 horas e está agora a pedir 100 dias para alcançar a paz, ameaçou na terça-feira impor mais sanções à Rússia se Putin se recusar a negociar um cessar-fogo com a Ucrânia.
Trump disse ainda que estava a reconsiderar o envio de armas para a Ucrânia e que tencionava falar "muito em breve" com o homólogo ucraniano, Volodymyr Zelensky, e com Putin.
"Se não chegarmos a um acordo em breve, não terei outra escolha senão impor elevados níveis de impostos, tarifas e sanções a qualquer produto que a Rússia venda aos Estados Unidos, bem como a outros países participantes", ameaçou Trump.
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