
A insegurança alimentar no Iémen tem vindo a acelerar constantemente desde o final de 2023, alertou hoje a ONU, estimando que o número de pessoas a passar fome no país pode ascender a 18 milhões até setembro.
A estimativa foi apresentada ao Conselho de Segurança da ONU pelo subsecretário-geral para Assuntos Humanitários, Tom Fletcher, que indicou que mais de 17 milhões de pessoas no Iémen passam fome atualmente, mas salientou que o número deverá aumentar nos próximos meses.
Mais de um milhão de crianças com menos de cinco anos estão em risco de vida devido a subnutrição aguda. Este número poderá subir para 1,2 milhões no início do próximo ano, deixando muitos em risco de danos físicos e cognitivos permanentes, frisou Fletcher.
"Não víamos este nível de privação desde antes da trégua mediada pela ONU, no início de 2022. (...) Esta deterioração está a acontecer no mesmo momento em que o financiamento global está a cair drasticamente, reduzindo a nossa capacidade de alimentar os mais vulneráveis", disse.
A lacuna de financiamento é também extrema para os serviços de saúde, especialmente para os 6,2 milhões de mulheres e raparigas que enfrentam a ameaça de violência de género, segundo as Nações Unidas.
Num momento em que o sistema da ONU está a ser abalado por uma grave crise de financiamento, as equipas no terreno no Iémen têm adotado uma estratégia de priorização das verbas, que estão a ser direcionadas para focos de emergência, como é o caso do combate à cólera.
Nesse sentido, a ONU conseguiu "manter a cólera sob controlo" ao concentrar-se na sensibilização e promoção da higiene a nível comunitário, ao mesmo tempo que direcionou apoio à saúde e ao saneamento para os pontos mais críticos.
"Como resultado, os casos de cólera caíram mais de 70% em relação ao ano passado, um avanço significativo num país onde a cólera é uma ameaça constante", anunciou Fletcher.
Contudo, apesar de alguns progressos humanitários, o subsecretário-geral reforçou que uma solução política continua a ser o único caminho para um futuro melhor para o povo do Iémen.
Na reunião esteve também o enviado especial da ONU para o Iémen, Hans Grundberg, que descreveu ao Conselho de Segurança o "período profundamente volátil e imprevisível" que o país e a região atravessam.
Grundberg expressou grande preocupação com a escalada no mar Vermelho, com ataques a dois navios comerciais no início desta semana por parte do Ansar Allah, resultando em vítimas e potenciais danos ambientais.
Os dois ataques foram realizados pelos rebeldes Huthis, um movimento político-religioso denominado Ansar Allah, cujos membros são maioritariamente xiitas do Iémen, apoiados pelo Irão.
Os Huthis atacam as embarcações no mar Vermelho em solidariedade com o grupo islamita palestiniano Hamas, em guerra com Israel desde outubro de 2023.
Estes foram os primeiros ataques a embarcações comerciais em mais de sete meses.
"A liberdade de navegação no mar Vermelho deve ser salvaguardada e a infraestrutura civil nunca deve tornar-se alvo de conflito. Acima de tudo, o Iémen não deve ser arrastado para crises regionais que ameaçam desfazer a situação já extremamente frágil do país", defendeu o enviado.
Sobre a crise económica que abala todo o Iémen, Hans Grundberg disse que o pouco dinheiro que as pessoas têm em mãos está a perder valor, levando a uma grande preocupação entre os cidadãos e em todo o setor privado.
Mas, apesar das dificuldades, Grundberg advogou que a economia é uma área onde a colaboração prática entre as partes pode criar mudanças significativas e ter um impacto imediato e positivo na vida dos iemenitas.
O enviado da ONU pediu medidas práticas que facilitem o pagamento integral e atempado dos salários, aumentem o poder de compra dos iemenitas, melhorem a prestação de serviços e estimulem a economia.