Luís Montenegro quer que as suas declarações de rendimentos e património não sejam consultadas publicamente. Depois das eleições legislativas de maio e da entrega das declarações a que por lei está obrigado, o primeiro-ministro submeteu pedidos de oposição à consulta pública das suas declarações de rendimentos, que está suspensa até uma decisão final do Tribunal Constitucional, informou esta terça-feira a Entidade para a Transparência.

Estes pedidos foram noticiados este fim de semana pelo Correio da Manhã e confirmados à Lusa e ao Expresso pela Entidade da Transparência (EpT) em resposta, por escrito, a pedidos de esclarecimento sobre o acesso às declarações únicas de rendimentos, património, interesses, incompatibilidades e impedimentos de Luís Montenegro. "A circunstância de algumas declarações únicas apresentada pelo Senhor Primeiro-Ministro terem constituído objeto de pedido de oposição (pendente de decisão) pode ser visualizada, na área de acesso público da Plataforma Eletrónica da Entidade para a Transparência, junto de cada uma das declarações, sinalizadas com um aloquete e a informação: Foi solicitado um pedido de oposição à consulta pública por parte do titular que, de momento, está em análise por parte da EpT. Por este motivo, a declaração não poderá ser consultada", respondeu a entidade.

Contudo, a tentativa de manter informação em sigilo pode dizer apenas respeito a parte dos elementos, tendo no entanto como resultado prático que toda a declaração fica inacessível. O Expresso voltou a questionar a EpT sobre o assunto. Isto porque Luís Montenegro sempre se recusou a revelar os clientes para os quais trabalhou na empresa e não os restantes elementos das suas declarações.

Ao contrário do que acontecia até aqui, depois de pedido de consulta à Entidade para a Transparência, nomeadamente por parte de jornalistas, era possível aceder ao conteúdo da parte que não é divulgada no site e que contém sobretudo informações sobre o património e registo de interesses dos políticos. Sem acesso a essa informação, não é possível aferir alterações substanciais de património ou outras informações relevantes para o escrutínio público. Neste momento, devido ao pedido submetido por Luís Montenegro, não é possível consultar as declarações entregues e que, no passado, permitiram saber que o primeiro-ministro detinha, em conjunto com a mulher, Carla Montenegro, a empresa Spinumviva, por exemplo.

Foi também possível aferir várias informações, no passado, nomeadamente relativas à casa de Espinho de Luís Montenegro e à compra de apartamentos em Lisboa ou ainda informações relativas a clientes para os quais trabalhou e que poderiam configurar conflito de interesses. Sem acesso público (sempre condicionado por decisão da EpT), não é possível aferir potenciais conflitos de interesse ou outras situações. Aliás, esta é a principal informação que está em causa.

O primeiro-ministro recusou sempre revelar quais os clientes para os quais trabalhou na empresa familiar defendendo que essa era informação que dizia respeito a terceiros e como tal, o pedido de oposição entregue visará manter essa informação sigilosa. Contudo, não terá efeitos práticos, apenas para estabelecer doutrina, uma vez que os clientes para os quais trabalhou foram não só sendo revelados pelos próprios ou pela Spinumviva depois de escrutínio mediático, como também acabaram por ser revelados pelo Expresso os últimos sete clientes.

A Entidade da Transparência explica que o teor destes requerimentos se encontra sob sigilo, confirmando apenas os pedidos de oposição à consulta pública por parte do primeiro-ministro e que estes requerimentos e o acesso às declarações de Luís Montenegro estão dependentes de apreciação pelo Tribunal Constitucional, não adiantando qualquer data para a resolução do processo.

"A decisão de alguns dos pedidos de oposição às declarações únicas apresentados pelo senhor primeiro-ministro está dependente da apreciação, pelo Tribunal Constitucional, da ação de impugnação das deliberações da Entidade para a Transparência, a qual possui, nos termos do n.º 3 do artigo 111.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, efeitos suspensivos", lê-se na resposta.

A Entidade para a Transparência esclarece que a legislação que regula o exercício de funções de cargos políticos prevê este tipo de pedidos nomeadamente quando está em causa o "interesse de terceiros ou a salvaguarda da reserva da vida privada" e que até uma decisão final "o acesso aos elementos sobre os quais recaiu a oposição e a sua eventual publicitação ficam suspensos".

Neste momento, acrescenta a Transparência, as declarações que estão pendentes de uma decisão estão identificadas com um cadeado na área de acesso público da plataforma eletrónica da Entidade para a Transparência acompanhadas da mensagem acima referida.

No 'site' da EpT, é possível verificar que Luís Montenegro opôs-se à consulta de todas as declarações já entregues, relativas aos cargos de primeiro-ministro do anterior Governo, os dois mandatos como presidente do PSD, conselheiro de Estado e deputado. Não foi ainda submetida a declaração de interesses relativa ao cargo de chefe do atual executivo.


NOTA: Notícia actualizada pelas 13h10 com a informação que a tentativa de manter em sigilo a declaração pode ser relativa a determinados elementos, nomeadamente à lista de clientes, mas que tem como resultado prático que toda a declaração fique inacessível.