
Quando abriu portas, em 1995, o Cafeína era um restaurante improvável, apostado em influências internacionais num Porto onde dominava a tradição. 30 anos depois, a consistência e a capacidade de acompanhar, discretamente, as tendências da cozinha numa cidade onde o panorama gastronómico mudou radicalmente, continuam a comprovar que este é um espaço fora de série.
“Tudo o que fiz até hoje foi de longa duração. Tem a ver com a minha maneira de ser”, justifica Vasco Mourão, proprietário e ideólogo do projeto que a partir da Foz criou um império de restauração com identidade própria. “Quando abrimos portas, nunca imaginámos o impacto que este espaço viria a ter na vida da cidade e na história da gastronomia portuguesa. O Cafeína nasceu do desejo de criar algo autêntico, onde a cozinha, o serviço e o ambiente estivessem em harmonia”, descreve.
Um restaurante de inverno com energia
Vasco Mourão já tinha dois negócios de restauração quando idealizou o Cafeína: o Café na Praça, junto à Torre dos Clérigos, no centro do Porto, e o Praia da Luz, aberto em 1989 na praia homónima, também na Foz. “Queria ter um negócio de inverno”, conta. Inicialmente, o espaço abriu como cafetaria, elemento que lhe deu “muita energia” e restaurante. Só em 2007 passou a ser “apenas restaurante e tornou-se mais sério”, destaca. A lembrar essa atmosfera inicial, durante este verão está previsto o regresso de uma área descontraída, um deli bar, com uma ementa mais ligeira e horário alargado. A ideia passa também por “atrair uma clientela mais jovem”, assegura.
Segredos da longevidade
“Nunca fui às compras, nunca cozinhei e nunca servi às mesas”, garante o empresário. O desconhecimento destas dinâmicas não foi impedimento para construir um império onde, além do Cafeína, se somam restaurantes como o Terra, o Portarossa, a Casa Vasco, e o Lucrécia. Para a longevidade do primeiro encontra várias justificações: a “duração e o sucesso do Cafeína têm a ver com muitos fatores” e um deles foi apontado pelo arquiteto responsável pela renovação do espaço, em 2020, e cliente habitual, José Carlos Cruz: “já sei qual é o segredo”, terá confidenciado a Vasco Mourão, “é a acústica. Mesmo quando estamos sozinhos nunca nos sentimos sós”. O som das pessoas a falar “envolve a sala” e os comensais, concorda o proprietário que também aqui almoça “muitas vezes sozinho”.
Ao longo de 30 anos, há clientes constantes que nunca deixaram de vir. “Alguns tinham 50 anos e agora têm 80”, mas também há gerações mais novas, hoje na casa dos 30, que regressam depois de terem vindo com os pais. A ideia sempre foi ter clientela “entre os 7 e os 77”, conta.
Concebido por Paulo Lobo, o famoso arquiteto de interiores que, na altura, assinava o seu “primeiro projeto oficial de decoração”, o Cafeína marcou uma época e rapidamente se tornou o restaurante de referência da cidade.
A antiga casa de família, do século XIX, adaptada a restaurante, sofreu nova obra de reabilitação em 2020, desta vez pela mão do arquiteto José Carlos Cruz que com sensibilidade e mestria soube atualizar o espaço mantendo a atmosfera e a personalidade que sempre o caraterizaram, oferecendo uma renovação praticamente impercetível à vista desarmada. Essa forma discreta de manter atualidade renovando o detalhe tem sido uma constante no Cafeína também à mesa.
Revisitar os clássicos
A conjugação entre pratos internacionais à época raros na restauração portuense e clássicos nacionais revisitados confere, ainda hoje, personalidade distinta a este restaurante. Inspirados na cozinha francesa, saladas que faziam as vezes de prato principal e algumas abordagens à cozinha italiana completavam a carta do espaço onde também nunca faltaram diferentes versões de pratos portugueses, oferecendo cosmopolitismo à ementa. Por exemplo, “foi um dos primeiros a servir “Salmão fumado” e o “Tártaro” (€14,50) nunca saiu da carta – atualmente de atum e servido com gaspacho de tomate.
São várias as propostas que se mantém desde a abertura, embora atualizadas e revisitadas à luz da atualidade. É o caso da “Tosta de gambas” (€14,30), o Bife Wellington (€28) ou uma versão do “Bacalhau à Conde da guarda”. Até ao fim do ano, a ementa reflete a celebração, incluindo pratos que se tornaram ícones ao longo dos anos. Cabe a Camilo Jaña, chef executivo dos vários espaços de restauração do grupo, definir conceitos e atualizar ementas, mantendo o foco nos conceitos que definem cada restaurante.
Revival com os olhos portos no futuro
Ao longo de 2025, sem periodicidade fixa e com a agenda ainda a ser definida, são vários os chefs de diferentes gerações que vão passar pelo Cafeína para celebrar, a quatro mãos, com Camilo Jaña, chef executivo, estas três décadas de vida. Cafeina Signatures é a designação escolhida para diversos momentos da festa que se inicia com chefs que marcaram a cozinha da Invicta no passado. Pedro Nunes, do restaurante São Gião, outrora responsável pelo restaurante 44, é um de vários cozinheiros convidados.
Da nova geração, prometem partilhar a cozinha chefs que também passaram pelos bastidores do Cafeína (Rua do Padrão, 100, Porto. Tel. 22610805), uma escola para nomes hoje consagrados como Nuno Castro, do Fava Tonka; Angélica Salvador, do Indiferente; Nuno Brás, do Kaigi, do Grupo Euskalduna; Pedro Pena Bastos ou Jonathan Seiller, do Vinha Restaurante, uma geração que “certamente acompanhará o Cafeína nos próximos 10 anos”.