A crescente sofisticação da espionagem chinesa contra indústrias estratégicas holandesas está a alarmar as autoridades dos Países Baixos. O alerta partiu este sábado do novo ministro da Defesa, Ruben Brekelmans, que, à margem da conferência Shangri-La Dialogue, em Singapura, afirmou que as tentativas de acesso indevido a propriedade intelectual — sobretudo no setor dos semicondutores — estão a intensificar-se.

“O setor dos semicondutores, onde estamos tecnologicamente na dianteira, é naturalmente atrativo para a China”, declarou Brekelmans, num raro reconhecimento público da pressão que Pequim exerce sobre ativos considerados vitais para a autonomia tecnológica e geopolítica da Europa.

O aviso não surge isolado. Já em abril de 2024, o serviço de informações militares neerlandês apontava diretamente o dedo à China, acusando agentes estatais de se infiltrarem nos setores aeroespacial, marítimo e, sobretudo, no da microeletrónica. O objetivo seria transferir conhecimento estratégico para reforçar o complexo militar-industrial chinês.

Quando questionado sobre se estas atividades tinham cessado, o ministro foi perentório: “Continuam. Os nossos relatórios mais recentes identificam a China como a maior ameaça cibernética. A maioria da atividade maliciosa que enfrentamos provém de lá. Isso já era verdade no ano passado — e está a agravar-se”.

O Ministério dos Negócios Estrangeiros da China recusou comentar diretamente as alegações, mantendo a habitual negação de qualquer envolvimento em ciberespionagem. Pequim tem repetidamente afirmado que se opõe a todas as formas de ataques cibernéticos e que respeita a soberania digital dos Estados.

Mas a realidade no terreno parece contradizer a retórica diplomática. No ano passado, os serviços secretos holandeses revelaram, pela primeira vez, que piratas informáticos apoiados pelo Estado chinês conseguiram penetrar numa rede militar neerlandesa, numa operação que sublinhou a crescente audácia de Pequim no domínio digital.

Para Haia, esta não é apenas uma questão de segurança nacional, mas também de soberania económica. “A China está a usar a sua posição económica para fins geopolíticos e para nos pressionar”, avisou Brekelmans. Em resposta, os Países Baixos reforçaram os instrumentos de proteção de indústrias críticas e estão a promover uma política de desacoplamento seletivo em relação a Pequim.

Esta estratégia, porém, não pode ser unilateral. “Tanto a nível europeu como nacional, precisamos de dar passos mais firmes para reduzir a nossa dependência de matérias-primas críticas oriundas da China”, acrescentou o ministro.

A questão ganha particular relevo no contexto da indústria de semicondutores, onde a holandesa ASML é líder mundial em tecnologia de litografia avançada — uma posição que a torna alvo prioritário de interesses estrangeiros. Apesar das pressões de Washington, Haia tem procurado equilibrar o seu papel entre a proteção dos seus ativos estratégicos e a manutenção das suas relações comerciais com a China.

A intensificação da espionagem tecnológica chinesa poderá forçar uma redefinição dessa balança. O desafio será manter a abertura económica que caracteriza a Europa sem comprometer a sua resiliência tecnológica e autonomia estratégica num cenário de crescente competição sistémica.

Com informação Reuters