
"Na Editorial Presença, sentimos profundamente esta perda. Filipe Guerra foi, mais do que um tradutor brilhante, um verdadeiro companheiro de percurso. Deixa uma marca indelével na história da nossa casa e nos corações de todos os que com ele tiveram o privilégio de trabalhar", afirma, em comunicado.
O tradutor Filipe Guerra morreu no domingo, aos 77 anos, no Hospital Garcia de Orta, em Almada, vítima de doença prolongada.
Durante décadas, Filipe Guerra dedicou-se à tradução direta do russo, em colaboração com sua mulher, Nina Guerra, com quem formou uma das duplas mais respeitadas da tradução literária em Portugal, destaca a editora.
"Juntos, assinaram traduções absolutamente centrais no nosso catálogo, entre elas 'Guerra e Paz', 'Anna Karénina' [de Tolstoi], 'Demónios', 'Crime e Castigo', 'O Idiota', 'O Jogador' [Dostoievski] e muitas outras obras que marcaram o imaginário dos nossos leitores".
O grupo editorial recorda as declarações de Filipe Guerra, numa das suas raras entrevistas, em que afirmou que "Dostoiévski e Tolstói são os principais herdeiros de uma forma de escrever inédita, inovadora, baseada no realismo, iniciada por Púchkin e Gógol".
Para o tradutor, "os livros destes dois autores, como obras artísticas, continuam atuais: são a fonte, a nascente ainda viva do que se escreve nos dias de hoje".
A Presença compromete-se ainda a "continuar a honrar o legado que construíram juntos".
Além de ter traduzido para este grupo editorial os grandes clássicos russos, Filipe Guerra e Nina Guerra assinaram também traduções para outras editoras como a Relógio d'Água e a Assírio e Alvim.
Nascido em 1948, Filipe Guerra formou-se em Filologia Românica na Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa, que acumulou com o curso de Linguística da Université Paris VIII (Vincennes).
Exerceu toda a sua atividade profissional ligada à cultura e ao livro, tendo trabalhado e feito parte da direção da Cooperativa Livreira Esteiros, a partir de 1975.
Filipe Guerra também escreveu e realizou programas radiofónicos semanais sobre livros na rádio, nomeadamente para a RDP1 e Antena 2, entre 1979 e 1982.
Paralelamente, colaborou com jornais e revistas literárias, nos quais publicou artigos da sua autoria.
Nos anos 1986 a 1989, Filipe Guerra desenvolveu trabalho de tradução literária na Editorial Progresso, em Moscovo, cidade onde conheceu Nina Guerra, que posteriormente se fixou em Lisboa.
Entre 1989 e 1991 fez trabalho de revisão literária e de tradução na Editorial Caminho e, a partir de 1994, passou a trabalhar em exclusivo na tradução do russo, em colaboração com Nina, contando com mais de 70 títulos traduzidos em conjunto.
Individualmente, Filipe Guerra fez traduções do francês, do espanhol e do italiano, num total de mais de 40 títulos.
A dupla Filipe e Nina Guerra recebeu em 2002 um prémio da Sociedade Portuguesa de Autores e do Pen-Clube Português pelas traduções das obras de Dostoiévski e Tchekhov, e em 2012 o prémio especial do júri da revista LER/Booktailors pelas suas traduções literárias.