
A Europa enfrenta um desafio económico de “grandes proporções”: financiar simultaneamente a transição digital e a transição verde, assinala Miles Parker, economista-chefe do Banco Central Europeu (BCE), num artigo publicado nesta terça-feira no blog do BCE.
Nomeadamente, a transição ecológica exigirá um investimento adicional anual de 2,7% a 3,7% do PIB da UE até 2030. O Banco Europeu de Investimento identificou um défice de investimento em IA de cerca de 5-10 mil milhões de euros por ano.
Refere também que cerca de 40% das pequenas e médias empresas referem a falta de disponibilidade dos investidores para financiar investimentos ecológicos como um obstáculo muito significativo. E que as jovens empresas europeias recebem apenas um quarto do financiamento de expansão de que beneficiam as empresas americanas.
Assim, a crescente procura por eletricidade coloca estas duas transições “em rota de colisão”, com implicações diretas no crescimento económico e na estabilidade financeira da região.
De acordo com o economista-chefe do BCE, a IA e a transição verde partilham desafios comuns e, se bem geridas, podem complementar-se. O BCE destaca que os centros de dados, essenciais para a IA, são grandes consumidores de eletricidade. Em 2023, estes centros representaram 21% do consumo elétrico na Irlanda, superando o consumo de todas as habitações urbanas do país.
Também exemplifica que o impacto da IA no consumo elétrico é notório: uma pesquisa no Google consome 0,3Wh, enquanto uma pesquisa com recurso a IA pode exigir até 9Wh, um aumento de 300 vezes.
Já a transição verde também requer grandes volumes de eletricidade, nomeadamente para alimentar os nove milhões de veículos elétricos e os 11 milhões de bombas de calor previstos para os próximos anos na União Europeia.
A dificuldade em expandir a capacidade de energia renovável agrava esta situação. A aprovação de novos projetos pode levar anos, prejudicando os objetivos climáticos. No entanto, a IA pode ser uma aliada na aceleração desta transição, refere. Exemplos disso incluem a otimização de localização de parques eólicos, a previsão de oferta e procura de energia e até a redução de consumo elétrico em centros de dados em 40%.
Para garantir que estas transições não se tornem antagonistas, “é crucial ultrapassar os entraves burocráticos na concessão de licenças para infraestruturas energéticas e reforçar o investimento”, defende.
O BCE sublinha que a Europa está a perder terreno neste campo, necessitando de investimentos anuais entre 2,7% e 3,7% do PIB até 2030 para a transição verde e de 5 a 10 mil milhões de euros adicionais por ano em IA.
O reforço das competências laborais em áreas como ciência, tecnologia, engenharia e matemática é outro fator essencial. Sem uma força de trabalho qualificada, a adoção de novas tecnologias será mais lenta, comprometendo os ganhos de produtividade e a sustentabilidade.
Em conclusão, embora a IA e a transição verde pareçam competir por recursos energéticos, ambas podem beneficiar da mesma transformação tecnológica, assinala o economista-chefe. “Tendo em conta estes desafios, as políticas nacionais em matéria de ambiente e de IA beneficiariam de uma integração mais concertada para aproveitar as sinergias entre estas duas transições. Há também um papel a desempenhar pelas políticas e pelo financiamento a nível europeu, em especial nos casos em que os benefícios ambientais da IA podem ser generalizados, mas têm menos aplicações comerciais. No seu conjunto, estas medidas podem ajudar a garantir que os desafios comuns a ambas as transições possam ser ultrapassados e que, em vez de entrarem em conflito, ambas sejam realizadas com êxito”, resume.