Cada vez mais em voga dado o crescente conhecimento e prevenção, o tema das lesões assume outro patamar quando jogadores de dimensão internacional por elas são atingidos. Uma realidade familiar para Renato Sanches que, pela terceira vez na temporada, se vê afastado da competição por isso mesmo. Azar? Propensão genética? Stress mental que propícia tais contratempos?

Perguntas às quais fomos ao encontro de explicação com a ajuda de João Lapa, antigo recuperador físico e preparador de clubes como Wolverhampton ou Famalicão, que não tardou em dar o seu ponto de vista.

«Padrões de movimento menos corretos propiciam lesões»

«Os clubes fazem sempre um trabalho de investigação em relação ao ativo humano que têm. Acredito que, hoje em dia, uma grande parte das lesões que ocorrem estão diretamente ligadas com a dinâmica das cargas e com a recuperação», introduziu, explicando, de seguida, algumas razões que muitas vezes levam a contratempos físicos.

Ao longo da carreira, Renato Sanches já contraiu 20 lesões musculares @Kapta+

«Há outros fatores que podem influenciar ao nível de fatores mecânicos. Muitas vezes, há jogadores com padrões de movimento menos corretos, que se tornam mais propícios ao aparecimento de lesões. Os clubes investem muito nessa área e mitigam ao máximo esse tipo de situações e a sua reincidência. Numa visão mais holística, acho que vamos caminhando para uma análise mais interna do que se passa dentro dos jogadores, a sua resposta interna», acrescentou.

Ora, com áreas direcionadas para a carga física bastante estudadas pelos departamentos clínicos e físicos dos clubes, o estudo individualizado das particularidades de cada jogador pode ser a chave.

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«Na minha análise, e pela partilha de experiências com outros preparadores, acredito cada vez mais que esse tipo de jogador possa ter alguma capacidade intrínseca que não esteja a ser tão bem explorada ou conhecida. Hoje em dia, já conseguem fazer determinados exames para perceber, eventualmente, o que pode estar a criar algum tipo de inflamação ou desregulação interna ou que tipo de resposta à carga um jogador está dar», constatou.

Exames esses que um atleta tão suscetível às lesões como Renato Sanches, porventura, já conheceu.

«É um procedimento que normalmente é feito. Se percebermos que há um determinado jogador que tem propensão para a lesão, é feito um plano muito mais pormenorizado e individualizado para aquele jogador, de acordo com as necessidades e com as avaliações que são feitas. O jogador deverá fazer esse trabalho para melhorar alguns movimentos, controlo motor, algo relacionado com a mecânica dos movimentos e algum fortalecimento», esclareceu.

De Adama Traoré à importância do sono

Exemplos concretos? O de Adama Traoré, jogador que também prima pela potencia física. Ainda assim, e apesar das similitudes, não pode ser comparado, de forma direta, ao internacional luso.

«Trabalhei com ele durante algum tempo. Tinha alguns problemas no ombro, luxações... Fizemos um plano de recuperação que funcionou muito bem e ele não teve mais nenhum. Claramente não tinha falta de músculo. Nem sempre a resposta é meter mais força e músculo. Há outras componentes importantes. É preciso um trabalho individualizado, sempre que as avaliações detetam certas lacunas», contextualizou, antes de enumerar algumas das variáveis muitas vezes em jogo.

João Lapa contracenou com Adama Traoré no Wolves @Arquivo Pessoal

«O sono de cada jogador pode ser reparador ou não. O sono é um dos melhores reparadores físicos. A qualidade do sono pode interferir na recuperação e, se a recuperação não for bem feita, o jogador está mais propenso a lesões», conta: «O aspeto psicológico e mental também tem influência direta. Por exemplo, uma discussão antes do treino pode ter influência na quantidade de hormonas e na quebra de homeostasia, que é o nosso equilíbrio.»

«Por exemplo, tive jogadores com quem trabalhei que apresentavam muitas queixas musculares e desconfortos e, mediante uma avaliação ao nível da pedologia, percebemos que umas palmilhas adaptadas iam ao encontro das suas necessidades. Os problemas começaram a desaparecer», revelou ainda.

Alimentação: problema com potencial de virtude

A rematar, João Lapa explanou situações ocorridas em vários clubes europeus, normalmente, desconhecidas do grande público: «Havia um determinado jogador, contratado pelo clube, e o treinador não estava contente com o seu rendimento. O jogador treinava bem e aparentemente não tinha qualquer problema, mas o contributo não era considerado suficiente.»

Bruno Lage acredita na recuperação de Renato @Kapta+

«Após várias análises e uma série de estudos, percebeu-se que não podia ingerir um determinado alimento causador de uma inflamação. Foi feita uma reestruturação de como tinha de se alimentar e os outputs físicos melhoraram quase em 40 por cento. Resultado? Passou a ser titularíssimo!»

De resto, e regressando ao caso particular do médio encarnado, Bruno Lage já se encarregou de deixar o seu voto de confiança para o eventual regresso: «É de mentalidade de campeão. É como perder: tenho de olhar para o jogo seguinte, é cair e saber levantar. Só assim é que se consegue. O Renato tem tido essa capacidade.»

Palavras de apreço para o Golden Boy de 2016, que voltou a conquistar um troféu de águia ao peito - Taça da Liga diante do Sporting -, apesar da inconstância competitiva dentro das quatro linhas. Até aqui com 11 jogos divididos por 288 minutos, o objetivo de Renato Sanches passará certamente pelo regresso a tempo de ajudar o Benfica nos últimos meses da época. Um desafio a ser constatado - ou não - pelos amantes do Benfica e do futebol português.