
Ao fim de 2h08, percebendo que a esquerda de recurso de Mirra Andreeva ia bater fora, Lois Boisson deixou-se cair com as mãos a tapar a face, mas com todo o corpo em transe.
Mas tal como fez quando o destino a derrubou, há pouco mais de um ano, reergueu-se rapidamente, levantou o queixo e recebeu uma ovação.
Dois dias depois de bater Jessica Pegula (3.ª do ranking) nos quartos de final, a francesa de 22 anos afastou a número 6 do mundo e semifinalista da época passada, por 2-0, após salvar dois set points num primeiro parcial que durou 81 minutos e de recuperar de um 0-3 para 6-3 no segundo.
A história da primeira tenista francesa a chegar às meias-finais de Roland Garros desde 2011 não é um conto de fadas. É de super-heróis. Porque aconteceu muito mais pelo superpoder da superação dela do que por um movimento aleatório de uma varinha mágica.
A 13 de maio de 2024, uma rotura do ligamento cruzado anterior do joelho esquerdo, 13 dias antes do início de Roland Garros, deitou-lhe por terra a possibilidade de se estrear no torneio de sonho.
A organização tinha-lhe atribuído um wild card para premiar o momento fulgurante que vivia, com 23 vitórias em 24 jogos em terra batida, a superfície preferida da tenista natural de Dijon.
Ao sair do hospital, Boisson focou-se no objetivo com critério, disciplina e sacrifício. Durante longos e penosos nove meses, não houve diversão. Não pôde sequer voltar a pegar numa raquete. Porque era preciso apontar todas as energias para a recuperação do joelho.
«Não há segredo. Se está onde está neste momento é porque fez todos os esforços e até mais do que o necessário para recuperar em pleno», assegura Jonathan Dasnières de Veigy, treinador que a ajudou na recuperação, citado pela RCM.
Da poeira rumo ao estrelato
«Se está onde está...». Quando Veigy foi ouvido, era aos quartos de final do torneio parisiense que se referia. E falava assim, já com o mundo do ténis a abrir a boca de espanto.
Porque tudo neste percurso de Boisson é inesperado. Afinal, falamos de uma tenista que nunca tinha jogado um torneio de Grand Slam. Que era 361.ª do ranking WTA, e cujo melhor posicionamento que tinha tido até agora era o número 152, que ocupava quando se lesionou em 2024.
Agora, já depois de se apurar para o top-4 do torneio da capital francesa, mais do que se teronar na tenista com o ranking mais baixo a conseguir chegar às meias-finais de um Grand Slam nos últimos 40 anos, Boisson sabe que vai subir pelo menos 300 (!!), rumo ao 61.º posto da hierarquia mundial.
E há mais dados que tornam esta semana e meia a mais louca da vida de Boisson. Até ao início da 129.ª edição de Roland Garros, a tenista de 22 anos tinha amealhado 130 mil euros em prémios. Com as seis vitórias consecutivas somadas na competição já ganhou 690 mil euros. Seiscentos e noventa mil euros! Cinco vezes mais do que tinha alcançado até este torneio.
É preciso recordar que há um ano Lois Boisson estava num bloco operatório por causa de uma das mais graves lesões que um atleta pode sofrer? Não vale pena. A cicatriz está lá para lembrar. Mas a tenista valoriza mais a tatuagem que traz no braço direito e que resume a sua personalidade: «Resilience».
Segue-se Coco Gauff. Mas aconteça o que acontecer frente à norte-americana, número 2 do mundo, os franceses festejam o nascimento de uma nova estrela.