533 dias depois, Iván Marcano voltou a jogar pelo FC Porto. O espanhol enfrentou um longo processo de recuperação que passou por várias fases após a cirurgia: reabilitação, recondicionamento, retorno à atividade, retorno ao desporto, retorno aos treinos e, por fim, à competição.

«Há muitas evidências científicas acerca da lesão de rotura do ligamento anterior cruzado. O processo de recuperação no FC Porto é similar ao que é feito no Real Madrid, por exemplo. Este tipo de lesão é a mais dramática para qualquer atleta de futebol», começa por explicar a A BOLA o especialista em Medicina Desportiva, Alexandre Marques.

O caminho que o central teve de percorrer foi, muito provavelmente, duro, sinuoso e cheio de dúvidas, conforme explica o médico, ex-membro do departamento clínico do Gil Vicente.

«No fim do dia são os atletas com os seus botões quem tem de tomar decisões. E não é quando a equipa ganha e estão todos a celebrar, mas sim nas noites de chuva em que estão sozinhos em casa. E esses atletas têm muitos ‘bichinhos’ na cabeça, dependem do futebol. E eles têm de acreditar no processo, no médico, no fisiologista, em todos os profissionais. O trabalho de recuperação é multidisciplinar. Os atletas são controlados ao máximo num gabinete de alta performance», esclarece.

«Quem sofre este tipo de lesões precisa de trabalhar a estabilidade articular. Quer dizer, é importante que todos trabalhem. Trabalha-se pouco a prevenção. Os atletas não podem ter grandes diferenças entre a força da perna direita e a força da perna esquerda ou da força na parte da frente da perna e na parte de trás. Neste caso, o Marcano precisa de um grande reforço muscular na perna direita, o que obriga a que a outra seja também reforçada. O trabalho de prevenção tem de ser muito forte. É preciso aumentar a propriocepção, o equilíbrio, trazer-lhe a agilidade, a confiança e a explosão», acrescenta.

Aos 37 anos, Marcano superou nova lesão grave no mesmo joelho, o que requer cautelas redobradas.

«Este tipo de lesão é o primeiro fator de risco da osteoartrose do joelho, além do risco de nova rotura ser elevado. O ligamento cruzado anterior é muito importante na estabilidade do joelho, impede a translação da tíbia, ou seja, que a tíbia vá para a frente e coloque tensão sobre ele. Tudo tem de ser trabalhado. Quanto mais fortes os músculos, melhor a estabilidade articular e menos sobrecarga haverá», diz o clínico.

Alexandre Marques defende que Marcano tem de ser gerido e considera que este talvez tenha jogado demasiados minutos (75 minutos) em Arouca.

«O Marcano vai ter de ser gerido, ainda não tem ritmo de jogo. Os jogadores podem treinar muito bem e estar em boa forma física, mas o jogo traz desafios para os quais não estão preparados. É necessário ganhar minutos. Há dois grandes momentos de lesão não traumática: os primeiros 10/15 minutos, geralmente por mau aquecimento, e no final dos jogos, por fadiga. Se o atleta for levado ao extremo do cansaço, o risco de lesão é muito elevado. O corpo é a máquina deles e tem de estar alinhadíssimo. Até acho que foi arriscado metê-lo de início, mas correu bastante bem e ainda bem. Ele vai estar sempre um bocadinho mais protegido. Depois é preciso colocar tudo numa balança: médico, atleta, fisiologista e treinador, e perceber se os jogos valem a pena o risco. Um atleta tarimbado como ele sabe gerir o risco», conclui.

Permanece, portanto, a dúvida: estará Marcano apto para 90 minutos de alta exigência em Braga?