
José Mourinho pela primeira vez, desde que deixou a Premier League, tem a hipótese de vencer um campeonato. Desta vez, e a conseguir, será na Turquia e ao serviço do Fenerbahce. Um campeonato é título especial na carreira de um técnico e no qual Mourinho, outrora, era exímio em conquistar. Entre a sua passagem pelo FC Porto (2002-04) e sua saída do Inter de Milão (2010), ou seja, em nove das suas primeiras dez épocas como treinador, Mou venceu seis ligas (2002/03 e 2003/04 no FC Porto, 2004/05 e 2005/06 no Chelsea FC e 2008/09 e 2009/10 no Inter de Milão).
Seis dos 17 títulos que conquistou na primeira década da sua carreira, naquela que foi a sua década de ouro e na qual, por mais que uma vez foi o número um no mundo a orientar grupos de trabalho. Consequentemente, entre a sua passagem pelo Real Madrid (2010-13) e a sua saída da Roma (2024), o técnico só conquistara um campeonato por mais duas ocasiões: Em 2011/12 pelos merengues e em 2014/15 pelo Chelsea. O último campeonato com a marca Mou foi blue e fazendo uma viagem à história, foi uma equipa que deixou saudades.

Este Chelsea pelo qual Mourinho tentava o oitavo campeonato da carreira, incluía a ideia de jogo que o técnico setubalense trabalhou na maioria das vezes: 4-2-3-1 e pragmatismo. Embora já na altura ficava a ideia, em retrospetiva ainda mais, que se podia ter arriscado mais em muitos jogos, pois tratava-se de uma equipa que tinha uma qualidade indiscutível em termos de matéria-prima.
Apesar do técnico português se ter queixado na temporada anterior de falta de soluções (nomeadamente da “falta de golos” de Fernando Torres e Samuel Eto´o) e dos plantéis milionários dos adversários (Manchester City nomeadamente que seria o campão), a verdade é que para esta época, Abramovich fez muitas das vontades ao Special One. A chefia blue abriu os cordões à bolsa e ofereceu a Mourinho para 2014/15: Diego Costa (vindo do Atlético de Madrid onde foi campeão e melhor marcador), Fábregas (vindo do FC Barcelona), Courtois (regressado do empréstimo ao Atlético de Madrid onde fora também campeão), Filipe Luís (outro campeão no conjunto de Simeone meses antes), Loic Rémy (vindo do QPR após uma época impressionante no Newcastle Utd) e Drogba (regressado após passagem pelo Galatasaray).
Reforços de peso e qualidade, para juntar à qualidade que já havia: Hazard, Oscar, Ramires, Matic, Terry, Cech, Willian, Schurrle, Cahill, Ivanovic, Azpilicueta, Obi Mikel e … Salah. O egípcio e o alemão partiram a meio da época para a Fiorentina e Wolfsburgo, respetivamente, vindo no mesmo período para ajudar os blues, também da Fiorentina, Juan Cuadrado. Apesar de ser um grande jogador, o desempenho do extremo colombiano foi um fiasco (sem golos e assistências nos 14 jogos de escudo blue ao peito). Um caso parecido foi o do lateral esquerdo Filipe Luís, que no final da época partiu de regresso à capital espanhola, de novo, para as opções de Diego Simeone.
Na época, aquilo que se exigia deste Chelsea de Mourinho, cumpriu-se durante praticamente toda a primeira metade da temporada. Uma equipa mandona, dominadora e que venceu a maioria dos jogos. A equipa teve uma taxa dominadora de triunfos na temporada, com 36 vitórias em 54 jogos. No entanto, apesar do excesso de jogos que terminaram empatados (14), destaca-se neste Chelsea de 2014/15 o número reduzidíssimo de derrotas. Num total de quatro vezes que os adeptos do Chelsea saíram do estádio de cabeça baixa, três foram para a Premier (Newcastle, Tottenham e West Brom), sempre fora de casa e nenhuma delas retirou os blues do primeiro lugar constante ao longo da época. A única derrota em casa foi inesperadíssima, frente ao Bradford City (2-4) para a quarta ronda da taça de Inglaterra. Uma das deceções da época, a outra seria na liga milionária.
Além de não ter perdido um único jogo a contar para a taça da liga inglesa (a outra competição que vencera em 14/15), surpreendentemente este Chelsea de Mourinho não perdeu um só jogo para… a Champions League… na qual foi eliminado nos oitavos de final. Após quatro vitórias (duas sobre o Sporting e duas goleadas no Maribor, em casa e Schalke 04 fora) e dois empates (alemães em casa e eslovenos fora), nos últimos 16 da competição, saiu aos londrinos no sorteio o bicampeão francês, PSG (onde brilhavam Ibra, Cavani, Pastore, Lavezzi, Verratti, Matuidi, Thiago Motta, David Luiz ou o capitão Thiago Silva).
Na primeira mão do Parque dos Príncipes a 17 de fevereiro de 2015, o jogo foi disputado de maneira previsível. A posse, a iniciativa e o domínio pertenceu sempre à equipa da casa, com o visitante a estar desembrulhado num estilo defensivo e à espera de concretizar através de contra-ataques, que foram quase inexistentes (passes pouco acertados, falta de espaço, alguma desinspiração de Diego Costa e de algumas bolas paradas). O PSG teve cerca de meia dúzia de oportunidades de golo claras e poderia ter rumado a Stanford Bridge com uma vantagem clara, se não fosse a exibição influente de Courtois.
Quase um mês depois em Stanford Bridge, na segunda mão, algumas coisas impensáveis aconteceram. Com os golos fora ainda a valerem mais que os caseiros e o Chelsea em vantagem, esperava-se que os jogadores de Mourinho jogassem no erro do adversário e que os pupilos de Laurent Blanc dominassem o jogo, visto que precisavam de marcar golos para seguir em frente. Aconteceu que devia ter acontecido o oposto, visto que Ibrahimovic foi expulso à meia-hora e deixou os parisienses desfalcados cedo no jogo. Apesar do imprevisto e desfavorável acontecimento para o PSG, a verdade é que Mourinho e os seus jogadores não mudaram o seu plano, não arriscaram durante os sessenta minutos que se seguiram. O PSG conseguiu ser melhor, apesar das contrariedades, conseguiu mais cantos que os blues (11 contra sete) e tantos remates (13 contra 13) e oportunidades de golo quanto o Chelsea (seis contra seis).
Após uma primeira parte fraca, sem chances de golo e com os dois onzes a encaixarem-se um no outro, em bloco relativamente baixo e sem riscos e uma segunda metade em que se viu um PSG mais atrevido e a ter as melhores oportunidades, foram dois golos de canto que levaram a eliminatória para mais meia-hora de jogo. O Chelsea mantendo-se pouco atrevido marcou por Cahill a nove minutos dos 90, mas cinco minutos depois foi David Luiz que conseguiu premiar o esforço da sua equipa e castigar os seus ex-colegas.
No prolongamento e já algo acordados, os blues quiseram evitar os penáltis, entraram mais alerta e a querer resolver o assunto. Acontece que apesar de ter tido um penalti a seu favor, convertido por Eden Hazard e a castigar falta desnecessária de Thiago Silva, após o golo, a equipa de Mourinho retraiu-se e abdicou do controlo do encontro. Um erro de palmatória no pragmatismo de Mourinho e da sua equipa, pois esta opção levou a uma exposição à sorte e a um voltar a acreditar por parte dos pupilos de Laurent Blanc.
A verdade é que a seis minutos do fim, num canto e na zona da marca dos onze metros, John Terry e Gary Cahill marcaram-se um ao outro e esqueceram-se de Thiago Silva que estava atrás dos dois. Um erro crasso que permitiu que o capitão do PSG, saltasse sozinho, qualifica-se o seu clube para os quartos de final e conseguisse virar herói quando se esperava, 18 minutos antes, que fosse “o carrasco”. Este jogo acabou por ser um erro histórico da equipa inglesa, que faz com que se pense, ainda atualmente, que se a atitude tivesse sido outra… o que mais este Chelsea poderia ter feito nesta Champions League? Qualidade não faltava.

Cinco épocas depois de vencer o troféu pela última vez (2009/10 com Carlo Ancelotti), o Chelsea foi novamente campeão. Os pupilos de José Mourinho lideravam o campeonato desde o início e conquistaram justamente o título a três jogos do fim e com 12 pontos de vantagem do segundo classificado (Arsenal, mas que no fim seria o Man. City), após uma vitória por 1-0 sobre o Crystal Palace, em casa diante dos seus adeptos.
Os blues começaram a temporada com quatro vitórias consecutivas, incluindo triunfos emblemáticos por 6-3 e 4-2 contra o Everton (fora) e o Swansea (casa), respetivamente. A primeira derrota da época só surgiu em dezembro, em Newcastle (1-2), antes da qual Arsenal (2-0), Liverpool (2-1 em Anfield) e Tottenham (3-0) foram derrotados sem margens para dúvidas. Na segunda volta, destacou-se a goleada (5-0) no País de Gales, novamente contra o Swansea (uma das revelações da época) e o clássico que Hazard resolveu em casa (1-0), frente ao Manchester United de Van Gaal. Apenas duas equipas não foram derrotadas pelos homens de Mourinho, embora nunca lhes tivessem ganho igualmente: o Man City (dois empates a um golo) e a “revelação da época” Southampton (dois empates a um golo).
O então campeão Manchester City, orientado por Manuel Pellegrini, chegou a apanhar os blues no primeiro dia de janeiro. Um dia em que os citizens suaram para derrotar o Sunderland em casa (3-2) e o Chelsea fora derrotado pelos Spurs em White Hart Lane (3-5), num jogo épico, a resposta nas semanas seguintes foi taxativa. Durante os 15 jogos que se seguiram, até ao jogo do título, este Chelsea garantiu 11 vitórias e quatro empates, dando aos blues uma vantagem confortável. Uma situação que o City não acompanhou minimamente, pois nos dois meses que se seguiram ao primeiro de janeiro, apenas venceu dois jogos (Stoke City e Newcastle), empatou três (Goodison Park, Stanford Bridge e Hull City em casa) e perdeu os outros dois contra rivais (Arsenal em casa e Liverpool em Anfield).
Tratou-se de um esforço de equipa, uma aliança entre o talento e a disciplina, um grupo que fora reconhecido pelo feito de seis jogadores seus (Branislav Ivanovic, Gary Cahill, John Terry, Nemanja Matic, Eden Hazard e Diego Costa) terem sido escolhidos para o Onze do Ano da PFA. Os três defesas tiveram números impressionantes. Entre si, os dois ingleses e o sérvio realizaram-se 17 golos (oito de Terry, três de Cahill e seis de Ivanovic) e nove assistências (três de Terry, uma de Cahill e cinco de Ivanovic), além de um bom desempenho defensivo.
Vindo do Benfica no ano anterior, Nemanja Matic veio para oferecer tanto a este Chelsea. Além dos seus 49 jogos, com três golos e quatro assistências, o centrocampista sérvio teve um perfil de excelência no que diz respeito ao seu desarme e inteligência, além da personalidade, uma técnica satisfatória e um remate interessante (como aquele golaço fora da área nos 6-3 em Goodison Park).
Dispensando apresentações, Eden Hazard conquistou o prémio principal de jogador do ano pela primeira vez após uma campanha memorável. Em 52 jogos realizados durante toda a temporada, o astro belga fez 19 golos e 11 assistências. Um extremo que respirava técnica e virtuosidade, um autêntico craque.
Diego Costa foi melhor marcador da equipa em toda a época (21 golos) e foi o terceiro melhor artilheiro na Premier 14/15 (20), apenas superado por Kun Aguero (26) e Harry Kane (21). Nos seus melhores dias, o craque hispano-brasileiro destacava-se pelos seus excelentes remate e potência, boas desmarcações e umas notáveis técnica e condução de bola.
Embora não premiados, existiram nesta equipa outros elementos de destaque, incluindo Thibaut Courtois na baliza, que renovou a segurança na baliza dos blues (16 jogos sem sofrer qualquer golo) e Cesc Fabregas no meio-campo onde foi o cérebro (cinco golos e umas impressionantes 23 assistências), enquanto o lateral-esquerdo Cesar Azpilicueta cumpriu sempre bem o seu papel. Ramires ofereceu energia e consistência ao meio campo (quatro golos e quatro assistências em 34 jogos) , Willian virtuosidade (quatro golos e cinco assistências em 49 jogos), Oscar habilidade (sete golos e nove assistências em 41 jogos) e no ataque, Loic Remy e o regressado Didier Drogba acrescentaram peso na hora de finalizar (nove e sete golos respetivamente).
Já antes, no primeiro dia de março de 2015, estes blues de Mou levantaram a taça da liga inglesa pela quinta vez na sua história (terceira na carreira do português), com uma vitória por 2-0 sobre o Tottenham Hotspur.
Numa repetição da final de 2008, com a diferença do vencedor mudar de branco para azul, o resultado nunca aparentou estar em causa. Apesar de uma bola no ferro de Eriksen e alguma iniciativa dos Spurs, o Chelsea mostrou ter tudo controlado desde o momento em que o capitão, John Terry, colocou a equipa na frente do marcador já perto da pausa.
No início do segundo tempo, a vantagem foi ampliada quando o médio catalão Cesc Fàbregas colocou o esférico na posse de Diego Costa e o seu remate desviou em Kyle Walker, acabando nas redes.
Forte em contra-ataque desde a primeira parte, este Chelsea, através de Eden Hazard, quase chegou ao terceiro quando rematou a centímetros do poste, e do outro lado foi preciso uma e atuação à capitão de Terry para impedir que Kane ameaçasse uma redução no marcador.
O caminho para Wembley começou com uma vitória sobre o Bolton (2-1) em Stamford Bridge, seguido de um teste em condições complicadas em Shrewsbury (2-1) e consequentemente o Derby County fora (3-1). Um percurso regular que acabou por culminar numa meia-final a duas mãos contra o Liverpool (1-1 em Anfield e 1-0 após prolongamento em Londres).

Fica para a história uma época que não só a última em que o clube venceu liga e taça da liga na mesma temporada, como marca os pontos positivos da última estadia do “Special One” no seu primeiro emblema em Inglaterra e num estádio onde o seu nome foi cantado vezes sem conta.
“José Mourinho, José Mourinho, José Mourinho, José Mourinho, José Mourinhooo!”