
Parecia que estávamos a adivinhar. Na edição de ontem quando escrevemos que, para o duelo com a Alemanha, Portugal precisava de heróis à antiga, como Carlos Manuel, dono, há quase 40 anos, do imortal Pontapé de Estugarda naquela que, até esta quarta-feira, era única vitória lusa em terras germânicas (1-0); ou como Sérgio Conceição, autor de inesquecível hat-trick contra a Mannschaft no Euro-2000 (3-0), estavamos longe de imaginar que entre esses heróis estaria o… filho deste último, Francisco Conceição, e a lenda eterna Cristiano Ronaldo.
Mas assim foi e, por isso, a Seleção Nacional bateu pela terceira vez na história, em jogos oficiais, a equipa germânica e está de volta à final da Liga das Nações, prova que conquistou em 2019. Mas recuemos 90 minutos.
Tudo começou pelo onze. Quem diria que Roberto Martínez ainda iria surpreender tudo e todos desta maneira. Desde logo com uma espantosa alteração na lateral-direita, com a entrada para a posição de… João Neves, que nesta mesma Arena de Munique se sagrou campeão europeu no passado sábado.
Mas não só: Trincão mereceu a titularidade pela primeira vez em jogos oficiais e Pedro Neto também começou a partida; no banco ficavam Rafael Leão e, mais incrível, Vitinha, atualmente um dos melhores médios do Mundo. Isto tudo depois de, na véspera ter sublinhado que, como raramente lhe acontece, tinha «dois jogadores aptos para cada posição». Acabou, todavia, por optar por adaptação à direita…
A verdade é que desde os instantes iniciais pouco ou nada se notou tantas mexidas na equipa. Intensa, veloz e em modo pressão alta (altíssima, por vezes), a Seleção Nacional impunha-se na Arena do Futebol de Munique (assim lhe chama a UEFA para esta competição).
E, se a tática fazia um pouco de confusão, a dinâmica algo inovadora que Portugal apresentava mostrava-se eficaz: João Neves e Nuno Mendes, muitas vezes, em diagonais para o centro do terreno (para o médio do PSG, era quase instintivo fazê-lo), Rúben Neves perfeito nas compensações, Bruno Fernandes nas costas de Ronaldo e Bernardo Silva a iniciar a construção em zonas mais recuadas. Corria bem o jogo a Portugal na primeira parte.
Um primeiro tempo em que até foi a Alemanha a começar por deixar Portugal em sentido, quando, aos 4’, Goretzka, após jogada que enganou toda a defesa portuguesa, acabou por rematar fraco e à figura de Diogo Costa – ficava o aviso, mas apenas isso.
Porque Portugal respondia logo de imediato e agarrava no jogo, ao ponto de, salvo raras exceções (embora perigosas) por parte da Alemanha, poder dizer-se que, com maior ou menos dificuldades, controlou a primeira parte.
O pior foi depois do intervalo. Aos 48’, uma perda de bola de Trincão – em noite para esquecer depois da glória em Alvalade, no 5-2 diante da Dinamarca – acabou por resultar no 1-0 alemão, resultante de um cabeceamento perfeito de Florian Wirtz. A celebração germânica ainda ficou suspensa por uns instantes, para verificação se Rúben Dias tinha sido impedido de disputar a bola, mas durou pouco a esperança lusa. O golo foi validado.
O jogo de Portugal gritava por substituições e, também ao contrário do que é habitual, desta vez Roberto Martínez foi rápido a mexer na equipa e logo com três entradas: Vitinha para segurar a bola (Rúben Neves tinha visto amarelo e era um risco), Francisco Conceição para dar velocidade a um flanco que estava morto (Trincão em jogo para esquecer) e Nelson Semedo para compensar um esgotado João Neves na lateral-direita..
Pouco antes, Bruno Fernandes conquistou espaço e protagonizou belo remate em arco, mas ligeiramente ao lado. E, pouco depois (60’), CR7 cabeceava, mas por cima. E desesperava o capitão. A Alemanha estava motivada, forte e competente, mas…
Mas, por conta das substituições, também Portugal voltava ao jogo. E de que maneira, não só pela intensidade brutal que imprimiu ao duelo até final, mas sobretudo… pelo golo soberbo de Francisco Conceição: que obra de arte, que momento lindo para ver e rever e voltar a ver muitas vezes! O pequeno grande extremo partiu quase do meio-campo, foi em diagonal rumo à entrada da grande área de onde disparou em arco, em jeito e em força, sem hipóteses para Ter Stegen.
Decorria o minuto 63’, renascia a fénix lusa. O que se seguiu foi, de novo, fantástico: o passe de Bruno Fernandes a isolar Nuno Mendes numa vertical perfeita e, depois, a assistência perfeita, no limite, para Cristiano Ronaldo, do alto dos seus 40 anos, poder mostrar a portugueses e alemães que ainda está aqui para as curvas.
Até final, foi incrível o que Portugal fez na Arena de Munique, com intensidade total como raramente se viu e com Conceição ainda a estar perto do 3-1 por duas vezes (quase imitava o pai…).
Agora, venha França ou Espanha na final de Munique, já no domingo. A jogar assim, a Seleção Nacional pode sonhar.