
Começar frente aos glutões do basquetebol, gente omnipotente que é campeã mundial, com um alley-oop a conectar as mãos delicadas de um Rafael, Lisboa a entrar de rompante na área pintada, com o alcance de Neemias Queta na troposfera onde habita o cesto, proporcionou um espirro de entusiasmo, era Portugal a entrar elétrico, logo depois houve até um choque de surpresa eficaz quando o único a saborear a NBA teve a raridade de conseguir um triplo, de repente era a seleção nacional a encher o peito nas barbas da Alemanha.
O madrasto tempo expôs, aos poucos, a afronta, mas não o despropósito, que tal início causou. Ir para cima dos germânicos fê-los insistir em levar o jogo para o frenesim em concluir ataques, acelerar o ritmo e ligar uma tabela à outra com uma velocidade que eventualmente, esperavam eles, seria demais para Portugal. De facto, à entrada dos cinco minutos finais do 1.º período, já venciam. Acabariam por fechar com um 17-12 favorável, as mãozinhas de Schröder mostravam, o ímpeto de Franz Wagner a atacar o cesto também.
Mas, mesmo falível a lançar para três pontos, a insistir nos previsíveis bloqueios constantes do corpanzil de Neemias para desencantar vantagens no garrafão, a seleção, sem a bola, ia emperrando a Alemanha e enchendo os seus ataques de lombas. A organização dos portugueses fazia soluçar as tentativas que os germânicos queriam rápidas, a férrea defesa barrava as incursões dos adversários que só numa partida do EuroBasket não superaram a centena de pontos. A seleção defendia bem, fazia os germânicos atacarem pior por serem obrigados a demorarem-se mais do que pretendiam.
Álex Mumbrú, o treinador maltratado por uma infeção, saído do hospital onde esteve internado uma semana para estar à beira do campo, pela primeira vez, no torneio, era a cara do desânimo, a sua testa a precipitar-se com desgosto. A menos de quatro minutos do intervalo Portugal punha-se a ganhar por cinco pontos, o selecionador adversário pedia descontos de tempo, os alemães regressaram agressivos na defesa, a arrastarem os portugueses para a medição de estampas físicas, do choque constante de armaduras. A resposta foi espetacular: outro alley-oop, este mais estrondoso, de Neemias, que teve o cuidado de rugir virado para a bancada.
Quando chegou o descanso, foi o incrível a indicar a direção para os balneários. Portugal ganhava por 32-31 aos campeões do mundo.
A eficácia da seleção a visar o cesto era assim-assim, parca no desejável, mas a dos alemães, nos triplos (6%), mostrava o anormal desacerto de uma equipa que frustrada no seu ímpeto pela rapidez não lograva conjurar uma solução mais longe do alvo. Era previsível que a fúria germânica reagisse, como não. Fizeram-no com o acentuar da fórmula, apertaram no ritmo, promoveram mais choques com os portugueses para deles extraírem recuperações de bola para lançar ataques rápidos e fugirem à organização do cinco contra cinco.
O furacão de investidas que Franz Wagner costuma mostrar nos Orlando Magic, da NBA, irrompeu jogo dentro, o seu talento de raides e esticões individuais carregou contra Portugal, virou o placard e desnorteou por momentos a seleção. Até o camião de Neemias literalmente atropelou a trotinete de Rafael Lisboa, numa reposição de bola, fazendo desmoronar os seus corpos para os dois pontos mais fáceis da partida para o adversário. Os portugueses eram assolados pelo ritmo desenfreado, porém não atinado.
A coesão da seleção, quando não perdia a bola cedo nos ataques, a proteger o seu reduto arrancava precipitações aos germânicos. Quando não eram as penetrações de Wagner, ele sozinho a colocar os restantes a reboque, a sacar dois pontos ou faltas para lances livres, a Alemanha aparentava desespero a procurar os triplos. Enquanto buscavam respostas, Portugal mantinha-se perto, nunca a mais de oito pontos, graças a vários monstruosos assaltos de Neemias ao cesto. Com o 3.º período a cerrar a pestana, o certo caos dos campeões mundiais não ajudado por Schröder, cujo estilo deslizante na quadra era embalado por várias más decisões na batuta do jogo.
E clínico no seu aproveitamento de tais erros, Portugal empoleirou-se num triplo distante de Diogo Brito prévio a uma matreira abordagem ao cesto de Diogo Gameiro para ir ao último descanso com vizinhança colada aos germânicos: perdia, mas apenas por um ponto, 51-52.
O derradeiro quarto fez os alemães atentarem às suas miras, o que antes lhes custava passou a sair a preceito, do banco saiu Maodo Lô para congeminar triplos e triplos seguidos. Num ápice, a diferença passou aos 14 pontos, depois para os 16, chegou a estar nos 21, qualquer bola ia aninhar-se na rede portuguesa, a defesa do cesto deixava de ser um muro. A resistência quebrava tardíssimo, não cedo como os 0,9% dos votos que no site da FIBA sugeriam que Portugal ia perder o jogo.
Vendo a Alemanha fugir-lhe, a seleção precipitou-se, Travante Williams tentava três pontos, Diogo Brito imitava-o, todos quebravam no rendimento e o jogo ressentia-se, com mais faixas de rodagem no sentido da tabela portuguesa. Aguentar durante 40 minutos um taco-a-taco que poucos antecipariam sequer para um só quarto jogo seria sempre um mastodonte de tarefa face ao abismo de armas, recursos e aptidões. Quando Diogo Gameiro, na última posse de bola, abdicou dos segundos que havia para os jogadores irem aos passou-bens, havia um 85-58.
Mais de um terço dos pontos alemães (33) apareceram no último quarto.
Portugal despediu-se deste EuroBasket nos oitavos de final, muito reduzindo o estrondo atacante da seleção campeã mundial que a esta partida chegara com uma média de 105 pontos feitos por jogo. A seleção cumpriu o objetivo, bateu o pé a um adversário monstro, arrastou-o para erros e precipitações e nervos inesperados, mostrou que as fundações para o basquetebol português crescer estão aí para quem quiser ver e, depois, pretender fomentar ainda mais.