
Aurora Cunha anunciou que vai apresentar uma queixa-crime contra Dionísio Castro, irmão de Domingos Castro (presidente da FP Atletismo), devido a "ofensas a que foi alvo". Na origem da troca de palavras estarão as críticas da antiga atleta olímpica e campeão mundial à polémica medida da FPA sobre as licenças para competir numa prova de atletismo.
Em resposta, Dionísio Castro fez uma publicação dura no Instagram, que viria a apagar mais tarde, em que tece considerações fortes a Aurora Cunha: "É a maior chula do atletismo", podia-se ler, por exemplo.
Este sábado, Aurora Cunha publicou um longo texto a detalhar esta situação e a anunciar que tenciona agir judicialmente contra Dionísio Castro.
Leia a publicação de Aurora Cunha na íntegra:
"Ao meu querido país,
Hoje escrevo-vos com o coração em pedaços. Foi uma noite sem sono, passada em silêncio, entre lágrimas, sem o meu querido Mesquita, que tantas vezes me defendeu, e sem a minha Mariana, longe, no Canadá. Sentei-me no sofá de uma casa que ainda guarda a presença do homem da minha vida, que perdi há tão pouco tempo, e tentei encontrar palavras para expressar o que nunca pensei viver.
Aos 65 anos, depois de tudo o que fiz e vivi pelo atletismo, pelo meu país, pela saúde, pela vida, sinto-me profundamente magoada, humilhada e atacada. Nunca, em circunstância alguma, imaginei ser alvo de palavras tão baixas, tão cruéis e injustas como aquelas que ontem foram escritas publicamente por Dionísio Castro - figura pública, ex-atleta e irmão do atual Presidente da Federação Portuguesa de Atletismo, Domingos Castro.
Este ataque, absolutamente gratuito e repleto de linguagem ofensiva, ultrapassa todos os limites do razoável. Não é apenas uma difamação pessoal. É uma tentativa vil de silenciar uma mulher que ousou ter opinião, que ousou defender os atletas amadores e questionar uma medida injusta. É um insulto que envergonha o desporto e que envergonha o país.
Sou mulher, mãe, atleta olímpica, campeã mundial de estrada por três vezes, sobrevivente oncológica e há muitos anos embaixadora da Liga Portuguesa Contra o Cancro. Mas, acima de tudo, sou alguém que sempre viveu com o desporto no coração. Quem me conhece sabe que continuo, semana após semana, a apoiar as provas de estrada em todo o país - nas aldeias, nas vilas, nas cidades. Aplaudo todos, corro os últimos metros com quem chega, encorajo quem começa. Faço-o com amor, sem esperar nada em troca.
E por isso mesmo não posso calar. Porque o que foi dito não me atinge só a mim. É um ataque à dignidade de todas as mulheres, de todos os atletas, de todos os que acreditam que o desporto é elevação, respeito e ética.
Dionísio Castro pode não ter, hoje, um cargo oficial, mas aparece de forma constante em atos da Federação, ao lado do irmão, com os equipamentos institucionais da FPA. E o silêncio da Federação Portuguesa de Atletismo, perante esta gravíssima agressão verbal, é ensurdecedor. Esse silêncio legitima e normaliza. Esse silêncio compromete.
Por isso, informo publicamente que irei apresentar queixa-crime pelas ofensas de que fui alvo. Não por vingança, mas por justiça. Porque acredito que nenhuma mulher, nenhuma cidadã portuguesa, deve aceitar calada uma agressão desta natureza. E apelo a todos os portugueses, a todas as pessoas de bem: apresentem a vossa queixa moral. Não aceitem que isto se torne normal.
O desporto português merece mais. Merece melhor. E a Federação Portuguesa de Atletismo não pode estar entregue a quem tolera ou silencia a violência verbal, o insulto, a humilhação.
Agradeço, do fundo do coração, as milhares de mensagens de apoio que recebi de todo o país e da diáspora. É por vocês que me levanto. É por Portugal que não me calo.
P.S.: Os cobardes atacam e apagam. Mas não é por se apagar um post que o dano desaparece. As palavras ficaram ditas. E o país inteiro viu.
Com o coração partido, mas de cabeça erguida como sempre,
Aurora Cunha"