“A vitória do Benfica no Nacional de 1955, não obstante o ‘golpe de teatro’ que a ditou, não deixa de entrar na linha do esforço que o clube dos encarnados realizou com o objetivo de regressar à lista dos campeões.” Estas linhas podem ler-se na edição de 25 de abril de 1955 do “Diário de Lisboa”, um dia depois de o Benfica, com uma ultrapassagem pela direita, roubar ao Belenenses aquele que seria o segundo título da história do clube.

“Golpe de teatro”, dizia então o jornal, porque tudo aconteceu na última jornada do campeonato, depois de o Sporting marcar aos de Belém a quatro minutos do fim do jogo, num ressalto aproveitado por Martins quando já se ouviam foguetes no Campo das Salésias. Ficou tudo empatado, um resultado que não servia ao Belenenses. À mesma hora, o Benfica, na primeira época de Otto Glória na Luz, vencia confortavelmente o Atlético, em casa, por 3-0. E foi ali que se festejou o título, que, “sendo obtido surpreendentemente, não foi, paradoxalmente, uma surpresa”, escreveu também o “Diário de Lisboa”, dando conta do bom arranque de campeonato da equipa e dos métodos descritos como “revolucionários” de Otto Glória, que operou “no grupo uma transformação radical de figuras, de processos de preparação e de estilo tático.”

Daí para cá muitos outros revolucionários chegaram ou brotaram do futebol português, mas nunca mais houve troca de líder na derradeira jornada do campeonato. São 70 anos em que a mesma lógica imperou: quem saiu para a última ronda na liderança assegurou o título. O Sporting parte assim para o jogo frente ao Vitória — ainda com o objetivo Liga Conferência por confirmar — com a história do seu lado, mas há muito que a luta não era tão apertada, com duas equipas em igualdade pontual (79 pontos) depois do empate da penúltima jornada da I Liga no dérbi da Luz. As duas equipas jogam no sábado, às 18h. Se acontecer de novo “golpe de teatro”, como o de há 70 anos, o beneficiário volta a ser o Benfica, que joga no Minho frente a um SC Braga virtualmente sem hipóteses de chegar a 3º — teria de esperar pela derrota do FC Porto e vencer o Benfica por números que anulassem a diferença de golos para os dragões, que é agora de sete golos.

Há 70 anos, o Benfica sagrou-se campeão, depois de o Sporting roubar pontos ao Belenenses

Para o Sporting, que pode ganhar dois títulos seguidos pela primeira vez desde 1954, volta a surgir a hipótese de ser campeão em casa frente aos seus adeptos, algo que não acontece desde 1980 — em 2021 os leões confirmaram o título em Alvalade frente ao Boavista, mas sem adeptos nas bancadas, à conta da pandemia. Há um ano, a equipa então treinada por Ruben Amorim foi campeã no sofá, tal como em 2002, a duas jornadas do fim, depois de o Benfica perder em Famalicão.

Uma última jornada decisiva

Esta será a oitava vez este século que o título se irá definir na derradeira jornada e o Benfica é cliente habitual nesta luta, já que esteve em todas elas — e foi campeão em cinco dessas disputas. A primeira das quais em 2004/05, subindo ao topo da tabela depois de bater, na penúltima jornada, um Sporting que parecia embalado para a glória, com aquele golo de Luisão. Na última ronda, o Benfica, treinado então por Giovanni Trapattoni, garantiu o primeiro título nacional em 11 anos, mesmo empatando no Bessa — os rivais, ainda com hipóteses de chegar à liderança, não fizeram melhor.

Há dois anos, o Benfica, então treinado por Roger ­Schmidt, chegou a ter 10 pontos de vantagem para o FC Porto, mas com derrotas frente aos dragões, na Luz, e em casa do Chaves ficou tudo para decidir na derradeira jornada. Curiosamente, houve também dérbi de Lisboa na penúltima ronda, que foi o primeiro match point para os encarnados, mas, tal como no último fim de semana, tudo acabou empatado. Uma igualdade frente ao Santa Clara seria suficiente, mas o Benfica venceu os açorianos por 3-0 e chegou ao 38º título nacional.

Campeão com poucos pontos

Certo é que o campeão de 2024/25, seja Sporting ou Benfica, terá no máximo 82 pontos, que será um dos piores registos pontuais desde que a I Liga voltou a ser jogada a 34 jornadas, há 10 anos. Um campeão com apenas 82 pontos aconteceu em 2016/17 (Benfica) e 2019/20 (FC Porto). Há um ano, o Sporting foi campeão com 90 pontos, recorde do clube, o que mostra bem a irregularidade deste leão, que teve três treinadores durante a época (Amorim, João Pereira e Rui Borges). O recorde de pontos da I Liga continuará pelo menos mais um ano a pertencer ao FC Porto de 2021/22, que recolheu 91 pontos em 34 jogos.