A expressão ficou mundialmente famosa por ter sido proferida pelo rei de Espanha, Juan Carlos I, e dirigida a Hugo Chavez, Presidente da Venezuela. Chavez, durante a conferência Ibero-Americana, interrompia indelicadamente Zapatero, criticando-o sem qualquer autoridade moral, o que fez esgotar a paciência do Rei.

Este episódio, paradigmático de muitas situações da vida política, revisita a nossa memória sempre que alguém perde uma oportunidade de estar calado. Foi o que aconteceu com o Governador do Banco de Portugal.

No Boletim Económico de dezembro, o BP previu um regresso do país a um quadro deficitário em 2025, com uma derrapagem de 0,1 por cento do PIB. Previsão que choca violentamente com as projeções do Governo, a apontar ao excedente, choca com o FMI e choca com o Conselho das Finanças Públicas, que prevêem um excedente 0,4%, choca com tudo.

Choca, sobretudo, com o bom senso. O valor é absolutamente irrisível, a amplificação dada só é explicada pela vontade do Governador se confrontar com o Governo. Mas, o que provoca verdadeira indignação, é ter como protagonista o ex-ministro das Finanças, Mário Centeno, o ministro que mais recorreu a cativações.

Cativações que fizeram dos Orçamentos de Estado, aprovados na Assembleia da República, meras peças de retórica. Em 4 anos terão ultrapassado os 2.000 milhões de euros, nessas cativações ficaram os ordenados dos professores, a degradação de toda a administração pública, o esgotamento do SNS e de todos os serviços públicos.

Foram tempos de austeridade encapotada, os cortes não constavam do orçamento, mas eram aplicados na execução.

A perda de poder de compra dos portugueses registou valores pouco dignificantes. Em 2022 eramos o país da Europa com o poder de compra mais baixo, com 13.906€ per capita. Registando um decréscimo de 4,7% em contraciclo com a média europeia que apresentou um crescimento de 5,8%, conforme noticiou a revista Forbes. Não constituiu bom “cartão de visita” para Portugal.

O modelo de baixos salários já provou, à exaustão, não resultar. Mas foi este modelo que Centeno adoptou, com a forte redução do valor real dos salários da função pública. O Estado tem de dar o exemplo, se paga ordenados baixos o privado irá acompanhar, sempre foi assim e assim será.

Reduziu-se o défice e o peso da divida sobre o PIB (este último mais acentuadamente nos últimos anos, impulsionado pela inflação), mas o país não reformou o modelo económico.

Persistir nos baixos salários é ter como referências a China, a Venezuela ou a Coreia do Norte. É não perceber a tendência, não reconhecer e seguir as boas práticas, como são exemplo a Polónia e a Irlanda.

Portugal tem hoje uma geração muito qualificada, uma geração que não encontra país ao tamanho das suas capacidades. Por isso, emigram, procuram lá fora o que aqui lhes é negado, é negado o justo retorno pelo valor que têm.

Até quando vamos persistir neste erro? Olhar para as contas públicas com o foco na redução de despesa, ou aumento da receita por agravamento da carga fiscal, ao invés de promover a produtividade, é ter uma visão muito arcaica da política orçamental.

Em 2020, conforme divulgado pelo INE, Portugal registava a maior carga fiscal de sempre, com 34,8% do PIB. Este foi o último ano da governação do Dr. Mário Centeno.

Por tudo isto, é, no mínimo, bizarro anunciar preocupações com uma putativa derrapagem de 0,1% do défice para 2025.

Esqueça o 0.1 %, é insignificante. O que merece combate é este modelo de baixos salários. O legado que nos deixou é pesado e pouco recomendável, estamos a exportar “quadros”, os nossos melhores saem de Portugal, e importar trabalho não qualificado. A política de portas abertas à imigração, sem qualificações, só serviu para manter o modelo velho, o modelo de trabalho barato. Não funciona.

Será cativando empresas e empreendedores que poderemos inverter o modelo. Portugal não trata bem as empresas, sobretudo as mais pequenas. A carga fiscal e parafiscal desencoraja o mais arrojado investidor. Temos taxas estatutárias de IRC das mais elevadas da europa. Dizem, os opositores à descida do IRC, que com os benefícios fiscais as taxas efectivas (19% em Portugal em 2023) descem aos níveis médios da europa, mas o que não dizem é que 80% desses benefícios são atribuídos apenas a 10% das empresas, às maiores.

Dos mil e oitocentos milhões de euros em benefícios fiscais atribuídos em 2023, mil e quatrocentos milhões foram para apenas 10% das empresas, as de maior dimensão.