Após vários voos exigindo minúcia e paciência, Ben Nyberg e os investigadores do Grupo de Botânica da Madeira respiraram de alívio quando o sistema de drones concebido para recolher plantas raras de escarpas inacessíveis aterrou hoje com uma 'marcetella madeirensis'.

Foi a terceira recolha de plantas endémicas em escarpas inacessíveis da região, através dos drones Mamba, uma conjugação de dois equipamentos, já utilizada no Havai e a operar pela primeira vez na Europa.

No âmbito da prospeção realizada durante a semana, foram feitas recolhas na segunda-feira e hoje, sendo que uma delas aponta, segundo os investigadores, para uma nova espécie.

Hoje, a operação de Ben Nyberg, cientista que trabalha no Jardim Botânico do Havai e ajudou a criar esta inovação tecnológica, começou pouco depois das 10:00, na freguesia do Curral das Freiras, no coração da ilha da Madeira.

Foi feita uma primeira prospeção com um drone normal e, às 10:44, entrou em cena o sistema Mamba, composto por dois drones, um de maior dimensão e outro, na parte da frente, com umas pinças destinadas à recolha.

Nos primeiros voos a planta acabou por cair do drone, mas cerca de uma hora depois os investigadores finalmente aplaudiram a chegada da 'marcetella madeirensis' no equipamento pilotado por Ben Nyberg.

"É uma planta endémica da ilha da Madeira, exclusiva. É uma planta do sul da ilha, que só existe nestes socalcos metidos no meio das ravinas. É uma planta que pertence à família das rosas [...] e tem os sexos separados, portanto, femininas e masculinas, o que aumenta a dificuldade na conservação, porque, obviamente, se não tiverem masculinas e femininas juntas não vamos ter sementes e, portanto, é uma questão complexa", explicou o professor Miguel Sequeira, coordenador do Grupo de Botânica da Universidade da Madeira.

O grupo vai fornecer as sementes ao Instituto de Florestas e Conservação da Natureza, que guardará "os frutos e as sementes com reserva genética", indicou.

O Grupo de Botânica fará aquilo que costuma fazer com todas as plantas raras, acrescentou Miguel Sequeira: "Vamos recolher algumas folhas que estão ali em condições mais verdinhas, vamos utilizá-las para extrair DNA, vamos guardar esse DNA para estudos futuros de genética populacional para vermos se continua a existir, qual é o padrão de diversidade que existe dentro e fora das populações."

O professor realçou que na segunda-feira foi possível, pela primeira vez na Madeira e na Europa, "ir a uma falésia sem riscos para ninguém [...] para ir apanhar uma semente".

Em 2022, a equipa de investigadores já tinha localizado uma população que "parecia peculiar", à qual ainda tentou chegar a pé, sem sucesso, e na segunda-feira conseguiu recolhê-la junto ao Cabo Girão.

Chama-se 'Cheirolophus', um género único na Madeira, mas "é muito provável que de facto seja uma espécie nova", que agora carece de confirmação através dos estudos genético e morfológico. O processo não demora menos de um ano.

Frisando a importância deste projeto para a biodiversidade madeirense, Miguel Sequeira sustentou que a recolha de plantas em escarpas "já tem resultado na conservação de algumas espécies" no Havai, "porque permite, por exemplo, vir a fazer estacaria com espécies que apenas existem em ravinas e não se conseguia chegar, ou permite recolher frutos e sementes" para depois, em jardim, se obter "novas plantas que eventualmente voltam a ser recolocadas na natureza".

Também Ben Nyberg realçou que as duas regiões têm muitos dos mesmos desafios, e são compostas por "muitas plantas raras e endémicas e muitos penhascos".

"A paisagem é parecida, mas as plantas são completamente diferentes. Há muitas espécies únicas que só ocorrem aqui, então o trabalho é parecido, mas é importante fazer aqui também", sublinhou.

Pilotar este sistema de dois drones, composto por dois comandos com 10 botões cada um, é complexo, reconheceu, sublinhando que é um processo de aprendizagem constante e que "poucas pessoas no mundo" conseguem pilotá-lo.

"Foi desenvolvido apenas para este propósito e não muitas pessoas estão a fazer este tipo de trabalho", reforçou.

A iniciativa foi organizada pelo Grupo de Botânica da Faculdade de Ciências da Vida da Madeira, coordenado pelo professor Miguel Sequeira, em parceria com o Jardim Botânico do Havai, e contou com a colaboração do Comando Operacional da Madeira e do Instituto de Florestas e Conservação da Natureza da Madeira.

Foram recolhidas um total de três plantas, duas delas na segunda-feira, no Cabo Girão e na Ribeira Brava. Nos restantes dias, foi feita prospeção para que, no futuro, novos voos possam chegar a mais espécies na região.