
O último State of the global workplace da Gallup indica que, “a nível global, apenas 23% dos trabalhadores se sentem felizes”.
Na Amazon, registaram-se mais de 7000 livros sobre felicidade, em 2024, segundo indicam Alberto Ribera & António Nuñez (El líder ante la felicidad, 2024). Já o World Happiness Report do ano passado, coloca Portugal no 55.º lugar no ranking da felicidade, entre 143 países. Mas o que tem isto a ver com a moda vivida em tantas empresas de nomear um “Chief Happiness Officer (CHO)”? E por que se colocam neles tantas expectativas?
É que conforme revela Georg Dutschke, no estudo Happiness Works de 2021, os profissionais felizes têm menos 36% de absentismo, mudam de empresa 45% menos e são 9% mais produtivos. Ou seja, não é só felicidade, é também business!
Tomando como verdadeiros estes números, dir-se-á que há “mercado” para os “Chief Happiness Officer”, que as tentativas de contribuir para este tema estão na moda e que Portugal necessita de CHO para nos colocar num lugar de topo na lista dos países mais felizes. Embora se deseje intensamente a felicidade, nem sempre se procura do melhor modo, como recorda G.K Chersterton com a sua proverbial sabedoria: “Todo homem que bate à porta de um bordel está a procura de Deus”. E é experiência comum que também não está no acumular de riqueza, na ambição desmedida e a todo o custo, numa quietude vazia e asséptica.
Na verdade, é bem possível vivermos distraídos e passar ao lado de uma vida sublime e feliz… e isto é triste, porque só temos uma vida, é a nossa e é para valer.
Haverá um caminho reto que nos leve a uma vida feliz? Todos nós estamos familiarizados com a noção de que a distância mais curta entre dois pontos é a reta; mas a vida não é linear, não é “matemática”. Necessitamos “jogar às três tabelas”, precisamos aprender a arte do indireto.
Poderá haver uma chave-mestra para abrir a porta da felicidade? De acordo com o estudo longitudinal mais completo sobre o desenvolvimento pessoal de adultos que alguma vez se fez, The Harvard Study of Adult Development, iniciado em 1938 e ainda aberto, há um fator diferenciador e preditivo da felicidade: as relações interpessoais com qualidade e densidade - seja a nível familiar, amizades ou interações nas comunidades a que se pertence.
Do resultado deste estudo destaco duas boas notícias: nas sociedades modernas e cosmopolitas, onde a maioria de nós vive, estamos rodeados de pessoas, pelo que há sempre oportunidades de estabelecer e reforçar as relações interpessoais; e, em segundo lugar, sempre temos “orçamento” disponível - tempo e atenção para investir.
Isto mesmo apontava Søren Kierkegaard, quando sugeria: “A porta da felicidade abre para fora”, porque os nossos inumeráveis esforços para perseguir egoistamente a felicidade acabam sempre em miséria.
Porém, se abrimos a porta para fora, o que vemos? encontramos os outros, muitas vezes com as suas vulnerabilidades, as suas feridas, a sua escassez, a reclamar não só o nosso coração, mas também a nossa inteligência e os nossos braços, pois perante as necessidades dos outros não basta a empatia, se não entendermos o que se passa e se não tentarmos dar-lhe remédio.
Mas tudo isto também não basta. Há uns tempos, contaram-me a história de um sujeito apressado que, saindo da boca do metropolitano, reparou numa pessoa sem-abrigo a pedir esmola. Rapidamente encontrou no bolso algumas moedas que lançou no copo de plástico que o pobre colocara na manta à sua frente. Não tinha sequer dado dois passos, quando ouviu o tilintar das moedas lançadas fora pelo infeliz, ao mesmo tempo que lhe chegou aos ouvidos um grito de queixa: “ao menos, olhe para mim!”.
A chave-mestra da felicidade está nas relações interpessoais, mas não em relações frias, insensíveis, protocolares, impolutas, genéricas como bem sublinha aquele personagem de Fiódor Dostoiévski através do paradoxo de que “quanto mais gosto da humanidade em geral, menos aprecio as pessoas em particular”.
Ainda faz sentido alinhar com a moda do “Chief Happiness Officer”? sim, mas se for, ao mesmo tempo, um perito em humanidade.