O Bayern de Munique despede-se, no fim da época, de um dos nomes que esteve no plantel durante 25 anos: Thomas Muller. Um dos “gigantes” da Bundesliga viu a renovação a fugir-lhe por entre os dedos, consolando-se, apenas, com a extensão do contrato para jogar o FIFA Club World Cup, este verão.

Mas o seu legado na Bundesliga dificilmente será apagado.

O ar de tranquilidade, brincalhão e social que nos habitua em entrevistas e “off the record”, contrasta, de forma clara, na seriedade com que entra em campo e enfrenta qualquer adversário. Quem o defronta, já reconheceu a faceta feroz, não tendo medo de arriscar, mas a forma como o vemos jogar detona a prontidão em organizar a equipa e colocar-se, sempre, de forma exímia, onde é necessário. Capacidade de milhões, diria-se.

O “One-club man” tem direito a um capítulo nos livros de histórias do futebol alemão, não fosse ele o detentor do maior número de assistências da Bundesliga. Com um total de 170 assistências na competição até o momento, não há nenhum outro jogador que tenha a consistência de Muller.

Embora jogadores como Kevin De Bruyne e Emil Forsberg tenham tido temporadas excecionais em termos de assistências, nenhum deles manteve a consistência de Muller ao longo dos anos.

De Bruyne, por exemplo, registou 18 assistências na temporada 2014/15 pelo Wolfsburg, enquanto Forsberg alcançou 22 assistências na temporada 2016/17 pelo RB Leipzig.

Pode-se dizer, que em termos de assistências, Thomas tem uma classe própria, o que faz com que se tenha mantido no onze inicial durante tantos anos no Bayern.

O jogador de 35 anos, nascido e criado na Baviera alemã, iniciou a carreira como futebolista no clube da cidade, TSV Pähl, com apenas quatro anos, e aí se manteve até chegar às camadas jovens do Bayern de Munique, um dos maiores clubes da Alemanha. E a verdade, é que fez o que já não se vê muitos jogadores a fazer: manteve-se neste clube desde 2000, até à atual época, pelo que não deixa de pairar no ar a dúvida sobre a decisão do Bayern em não renovar um dos jogadores mais acarinhados do clube.

Além de que, detém em si, o recorde de mais jogos pelos “Die Roten”, com o excecional número de 743 jogos, nos quais marcou 247 golos.

O famoso pé direito não foi tão feliz em frente ao grande arco, mas mesmo assim não deixou de brilhar em diversas ocasiões: nos oitavos de final, entre a Alemanha e Inglaterra, em pleno Mundial de 2010, marcou dois dos quatro golos, e ainda deu assistência a mais um, tornando-o o “novo rosto” do futebol alemão daquela época.

Já para não referir o hat-trick no Mundial de 2014, que doeu na alma de todos os portugueses. Admito que, apesar da mágoa do resultado final (4-0), o dia 16 de junho de 2014 foi um grande dia para Muller, e também para quem, até esse momento, duvidava da capacidade de jogo do avançado.

O “raumdeuter” (intérprete de espaços) será sempre reconhecido pela capacidade de se colocar em espaços-chave para a finalização ou assistência ao golo, tendo uma versatilidade em campo fenomenal, como segundo avançado ou médio ofensivo, ou até descer até às laterais e construir o “falso 9”, e ainda uma inteligência tática como já não se vê há muitos anos na Bundesliga.

Numa liga em que o futebol rápido e ofensivo são a diretriz, Thomas Muller sempre percebeu que não seria o jogador mais rápido em campo. Mas em vez de carregar o peso da falta de velocidade, aprendeu a olhar para o jogo e para os companheiros de equipa como um todo, uma máquina que precisa de todas as peças, até as mais pequenas, para funcionar. E conseguiu, assim, levar o Bayern a várias épocas de glória.

Será coincidência que na época em que o Dortmund se está a sobrepor em termos ofensivos de jogo ao Bayern, também Muller tenha sido menos utilizado?

É de conhecimento geral que a Bundesliga gosta de dar palco a jovens talentos, como é o caso de Musiala ou Florian Wirtz, que oferecem dinâmicas muito mais tecnicamente evoluídas, mas será que deixou de haver espaço para jogadores mais maduros, com inteligência de jogo, experiência e boa adaptação a equipas técnicas?

É o fim de uma era para o Bayern de Munique, mas também para Thomas Muller, e até mesmo para a Bundesliga, mas os 12 títulos da Bundesliga, as seis Taças da Alemanha, as oito Supertaças da Alemanha, os dois títulos da Champions League, as duas Supertaças da UEFA, e os dois títulos de Campeão Mundial, estão pregados a ferro tanto na parede de casa de uma das maiores lendas do futebol alemão, como na parede do Bayern de Munique.

Ao mural de Robert Lewandowski, Michael Ballack, Giovane Élber, Mario Gotze e Andreas Moller (apenas citando alguns dos maiores goleadores e avançados da Bundesliga), junta-se agora Thomas Muller, que será sempre um ícone e uma referência no futebol alemão, mesmo com um final não digno de um dos melhores das últimas duas décadas (e com um futuro incerto).