O vento rezingão, a soprar forte de noroeste e desavindo com o ideal para os conformes da praia acolhedora do Caparica Surf Fest, tornou o mar revoltoso pelo quinto dia consecutivo da prova. As condições do mar dificultaram a vida às surfistas do evento da Qualifying Series (QS) no qual Francisca Veselko até nem precisava dos 1000 pontos lá postos à espera da vencedora: embalada pelo benfeitor ano que está a ter, a portuguesa estava já apurada para o circuito maior, o Challenger Series, o da sigla (CS) que realmente proporciona a escada para onde ela pretende chegar.

Ao começar cheia da supremacia apressada, vencendo nas ondas de Thagazout, em Marrocos, a etapa inaugural da costela europeia do QS - sim, no surf a geografia é torneável e o norte de África conta para a margem de lá do Mediterrâneo -, Francisca Veselko apoderou-se logo de um milhar de pontos, aos quais juntou os 1.825 da segunda prova em Pantin, na Galiza. O par de excelentes resultados pôs logo a fronha na almofada que aconchegou a sua vantagem, mesmo com a prestação assim-assim em Anglet (9.º e 945 pontos) e a boa, mas pouco retribuidora de Lacanau (5.º, mas apenas 500 pontos, por no seu todo valer menos).

Sem ser oficial, era garantido que ‘Kika’, ao pôr os pés na Caparica enquanto segunda classificada do ranking, estava já qualificada para o CS, circuito do qual saem as surfistas que entram no Championship Tour, o mundial de surf onde a portuguesa tanto quer estar e já viu as suas conterrâneas Teresa Bonvalot e Yolanda Hopkins, em anos diferentes, não entrarem lá por um pequeno triz. O sumário desta matéria é que a cascalense, de 21 anos, nem precisava de fazer isto que fez.

Impiedosa durante a prova, foi dominando as adversárias e este sábado foi quem saiu elevada em ombros do mar, os amigos livrando-a de ficar com areia nos pés após vencer a britânica Alys Barton, na final. “Ganhar aqui, em casa, não dá para me sentir melhor do que isto”, disse na ressaca dos 16 pontos que reuniu nas duas ondas (8.50 e 7.50) com que se superiorizou à adversária. “As condições estavam muito desafiantes, mas trabalhei para isto. Normalmente não são o meu tipo de ondas, custa-me surfar assim, mas trabalhar no duro compensa”, explicou a lançada portuguesa, que irá cheia de embalo para o desejoso Challenger Series.

Nesse circuito de sete provas e arranque agendado para junho, com uma paragem na Ericeira, em setembro, também estará Teresa Bonvalot, eliminada pela campeã da Caparica nas ‘meias’. Campeã mundial júnior em 2023 durante a sua erupção acelerada no surf adulto - nem um ano e meio antes, Francisca Veselko tinha vencido os títulos sub-18 e sénior em Portugal -, a filha de pais surfistas e cujo irmão também competiu neste evento aproveitará os próximos meses para se aprontar a remendar a prestação do ano passado no CS: ficou no 19.º lugar. Em entrevista recente ao “SAPO Desporto”, admitiu ter-se sentido “perdida”, sem concretizar aquilo “que gostava e não gostava”.

Nativa das ondas de Carcavelos e esta temporada com experiência de treino no Havai, tal fará já parte das dores de crescimento de ‘Kika’, uma surfista mais de profundas rasgadas nas paredes de água do que desenhar na tela ziguezagues constantes. “Eu apareci e ninguém me conhecia, a malta perguntava quem eu era”, contou, faz dois anos, à Tribuna Expresso. Raras serão as pessoas no meio que a desconhecem por estes dias. Francisca Veselko tem presente qual a próxima onda que quer: o circuito mundial de surf.