
Um ciclo alarmante está em curso: a realidade da subida do nível do mar ultrapassa já, de forma preocupante, as projecções científicas mais recentes. Embora a investigação científica seja um processo dinâmico que constantemente refina o conhecimento através da análise de hipóteses, a natureza envia agora sinais inequívocos de alerta que não podemos ignorar.
De acordo com os últimos dados divulgados pela NASA, em 13 de março de 2025, o nível global do mar subiu mais rápido do que o previsto em 2024, essencialmente devido à expansão das águas dos oceanos à medida que aquecem, ou expansão térmica. Segundo a NASA, a taxa do aumento do ano passado foi de 0,59 centímetros por ano, em comparação com a taxa prevista de 0,43 centímetros por ano. Ou seja, o aumento verificado em 2024 foi maior do que o esperado.
Cada ano é diferente, mas é evidente que os oceanos continuam a subir e esse aumento é cada vez mais rápido, como afirma Josh Willis, investigador do nível do mar, no Laboratório de Propulsão a Jacto da NASA, no sul da Califórnia.
Investigadores e especialistas alertam constantemente para esta inquietante realidade, não se cansando de enfatizar a natureza implacável dos impactos das alterações climáticas, em especial a subida do nível do mar que se destaca como um dos problemas globais mais graves que a comunidade internacional enfrentará nas próximas décadas.
O último estudo publicado em novembro de 2024, elaborado pelo ICCI (International Cryosphere Climate Initiative) - uma rede de investigadores seniores e especialistas em políticas públicas, constituída imediatamente a seguir à COP-15, em Copenhaga - é bastante exaustivo na sua avaliação em matéria da criosfera e impõe uma reflexão responsável pela sociedade civil e pelos decisores políticos, nacionais e a nível internacional.
O ICCI considera que as actuais Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs em inglês) - compromissos que definem os esforços de cada país para reduzir emissões de gases de efeito estufa (GEE) e adaptar-se às alterações climáticas -, são insuficientes para evitar um aumento da temperatura superior a 1,5 °C, e reflectem como muitos governos continuam a adiar medidas significativas de mitigação para 2040, 2050 ou além.
Deste modo, quanto à subida do nível do mar causada pelo derretimento de mantos de gelo (com extensão superior a 50.000 km²) e glaciares, a taxa global duplicou nos últimos trinta anos. Se estas tendências persistirem, as taxas poderão aumentar para 6,5 mm/ano até 2050, aproximando-se perigosamente dos limites de adaptação exequível.
O mesmo estudo do ICCI indica que as plataformas de gelo que circundam a Antártida podem ser mais vulneráveis ao colapso do que se julgava anteriormente. Estas plataformas de gelo ajudam a estabilizar a camada de gelo e a sua perda pode acelerar o degelo da camada de gelo e a consequente subida do nível do mar.
Por outro lado, os dados do ICCI indicam que, actualmente, a camada de gelo da Gronelândia está a perder, em média, 30 milhões de toneladas de gelo por hora, o que constitui o maior factor individual para a subida do nível do mar.
A forte probabilidade de muitos territórios costeiros serem inabitáveis em 50 anos - com as populações a viverem tragédias pelo desaparecimento dos seus habitats e, necessariamente, o reassentamento dessas comunidades noutros territórios, não é uma simples profecia, é a ciência e os cientistas a fazerem os seus preventivos avisos.
O caminho para o abismo que ameaça as zonas costeiras exige políticas firmes e decisões coordenadas a nível internacional. Impõe-se, com urgência, a implementação de medidas de adaptação eficazes.
Embora pareça economicamente mais vantajoso a curto prazo optar por uma transição energética lenta - reduzindo os custos imediatos de energia - esta abordagem resultará em perdas e danos generalizados à criosfera por décadas ou mesmo séculos.
Consequentemente, enfrentaremos necessidades de adaptação muito maiores e mais dispendiosas, mesmo nos locais onde tais adaptações ainda são tecnicamente viáveis.
No entanto, os recentes conflitos armados e invasões em diversas regiões do mundo, que resultaram em centenas de milhares de mortes e milhões de refugiados, despertaram um renovado sentimento de militarização nos governos e na opinião pública.
Consequentemente, a geoestratégia ganhou preponderância nos orçamentos dos estados-membros da União Europeia, sob o legítimo argumento de defesa da soberania territorial face à ameaça bélica de Moscovo - justificando assim a atual vaga de rearmamento europeu.
Enquanto isso, um invasor natural e indomável ameaça as linhas costeiras e fronteiras territoriais como as conhecemos: a subida do nível do mar, que poderá reduzir permanentemente zonas costeiras ou até submergir pequenas ilhas, com consequências irreversíveis.
Esta ameaça é verdadeiramente global, não poupando nenhum Estado - Portugal incluído.
Os alarmes estão a soar ininterruptamente e é crucial termos consciência que as fronteiras geográficas como existem estão a ser ameaçadas e o único exército que pode travar este combate somos todos nós!
O combate às alterações climáticas não pode ser relegado para o segundo plano, porque sem territórios não há Estados soberanos.
Nota: a autora escreve segundo o antigo acordo ortográfico.