
A disparidade entre a cotação oficial do dólar e o seu valor no mercado paralelo subiu significativamente na Venezuela nas últimas semanas, gerando preocupação entre os cidadãos, incluindo os luso-venezuelanos, que temem uma subida da inflação.
Segundo as redes sociais locais o dólar paralelo cotava-se na sexta-feira em aproximadamente 104,00 bolívares (1,38 euros)), no mesmo dia em que o Banco Central da Venezuela estabeleceu uma taxa oficial de câmbio de 59,56 bolívares (0,8 euros).
"O mercado negro, que estabelece a cotação paralela do dólar está proibido no país e até mediados de 2024 estava praticamente sem vida, com valores muito próximos ao afixada oficialmente, mas desde o último trimestre do ano o diferencial começou a ganhar força e há cada vez mais pessoas a dizer o valor do paralelo como valor diário de câmbio", disse um comerciante à agência Lusa.
O comerciante Alex Calderón Aguiar afirmou que apesar de a moeda venezuelana ser o bolívar, os preços dos bens e serviços são afixados em dólares à taxa cambial do dia, mas a população não consegue obter dólares a valores oficiais nos bancos e nas casas de câmbio e tem gerado pressões sobre os preços informais.
"Há cada vez mais pessoas a colocar nos seus 'estados' do WhatsApp a mensagem de que estão a comprar uma determinada quantidade de dólares e inclusive pelos comércios passam cada vez mais venezuelanos 'oferecendo' dólares a valores significativamente superiores aos oficiais", explicou.
Vários empresários disseram à agência Lusa que, mesmo usando os valores oficiais de referência, enfrentam dificuldades para repor alguns produtos, porque quando compram a crédito depois têm de pagar mais bolívares pelas faturas, mesmo quando pagam em numerário.
"Este diferencial de câmbio reaviva os temores, faz recordar anos passados em que a Venezuela registou valores historicamente altos de inflação. Além disso, os preços variam constantemente em dólares, fazendo disparar os valores na moeda local". explicou Alex Calderón Aguiar, sublinhando que as autoridades devem reforçar os esforços para controlar o mercado cambial venezuelano.
Os empresários temem ainda que a volatilidade da moeda aumente as dificuldades quotidianas dos cidadãos e reduza o consumo, situação que associada a cada vez mais alta tributação e ao aumento do preço dos serviços, poderá levar alguns estabelecimentos comerciais a encerrarem as portas.
No entanto, um número reduzido de venezuelanos considera-se privilegiado, pois trabalha remotamente para empresas estrangeiras que lhes paga eletronicamente em moedas diferentes que depois troca localmente.
"Essa situação não me tem afetado porque recebo euros que posso trocar, mas percebo que há coisas que aumentaram de preço em dólares. Durante a pandemia da covid-19 eu gastava 60 dólares mensais nas compras básicas para a minha família [de três pessoas] e agora gasto isso em menos de uma quinzena", explicou Lisette Fernández à Lusa.
A trabalhar em serviços ao cliente para uma empresa espanhola, diz que "o problema é que a inflação está dolarizada".
"Na Venezuela, nem todas as pessoas estão na minha condição. O salário mínimo é afixado em bolívares, e há algumas empresas que complementam com bónus em dólares, mas isso não conta para as compensações a receber na hora de trocar de emprego", disse.
Segundo o Observatório Venezuelano de Finanças (OVF), em fevereiro de 2025 a Venezuela registou 12,8% de inflação e uma taxa acumulada de 117% em 12 meses.