O anúncio de venda, colocado há poucos dias, antecipa-se à entrada em vigor do diploma publicado a 30 de dezembro que será uma oportunidade à espreita para os proprietários com terrenos rústicos empatados.

"Tenho este terreno há mais de 20 anos, comprei para construção, na altura era possível construir, depois com alteração de PDM deixou de ser e eu espero agora com esta nova medida que seja possível voltar a poder construir aqui”, diz Fátima Amorim, proprietária de terreno.

Entretanto classificado como terreno agrícola, o investimento em 2 mil metros quadrados divididos em duas parcelas só tem trazido despesas.

“Com esta possível alteração dos solos a ideia era vender um artigo e puder construir casa no outro, uma vez não tenho casa própria", explica Fátima.

Esta tem sido uma das principais dúvidas dos proprietários se podem ou não reclassificar o terreno rústico para o usar para habitação, mas em benefício próprio.

“Há muito proprietário de terreno rústico que gostava de eventualmente utilizar para construir casa para habitar ou uma casa para algum familiar habitar e a resposta à luz da lei é clara e não é possível. A ideia que dá é que aponta para habitação coletiva, ou seja, prédios, para classe média e normalmente estamos a falar de apartamentos T1 e T2”, explica Alfredo Valente, diretor-geral da imobiliária IAD Portugal.

Diploma obriga a construção de 70% do terreno

O regime jurídico de exceção obriga a ter 70% da área total de construção para habitação pública ou custo moderado, em zonas compatíveis com áreas urbanas. O preço final das casas tem gerado muita polémica, a especulação urbanística é o maior risco apontado por quem critica a ambiguidade do diploma, numa altura em que os terrenos rústicos já estão a valorizar nos sites das imobiliárias.

“O preço máximo previsto por este decreto de lei é mais de 20% abaixo da média do custo das casas nestes concelho”, diz Manuel Castro Almeida, ministro adjunto e da Coesão Territorial em entrevista à Renascença.
“Na verdade ninguém explica muito bem as contas dos 20% porque primeiro o terreno é uma pequena parte, uma relativa pequena parte da composição do preço final do imóvel. Há preço do terreno, os materiais, a mão de obra, a margem do promotor e há impostos”, explica Alfredo Valente.
“Dizer que vai diminuir 20%, nem acho que é fácil, nem está em causa saber se é 20 ou mais ou menos. A par desta lei deve haver mudança na carga fiscal”, diz Manuel Reis Campos, associações dos industriais da construção civil e obras públicas.

Especialistas temem falta de transparência

Nesta simplificação do processo, as autarquias ganham autonomia para promover o registo predial automático dos terrenos que terá de passar apenas pelo crivo das assembleias municipais, sem que haja um outro mecanismo de fiscalização para prevenir abusos ou falta de transparência.

"Faz-se uma alteração simplificada ao PDM, com parecer técnico do município, depois a câmara municipal aprova, a assembleia municipal analisa e aprova. E não é possível alguém convencer-me que vão corromper todos os elementos assembleia municipal", diz o ministro à Renascença.
“Eu não diria com essa tranquilidade que a segurança jurídica das assembleias está assegurada. Não está. Creio que a lei já é muito clara em matéria de PDM. Ora, estando a rever mais de metade dos PDM’s está aqui agravado o perigo em que podemos estar incorrer e, portanto, para que essa segurança jurídica existe é preciso assessores e equipas especializadas", explica Albino Almeida, presidente da associação nacional de assembleias municipais.

O Bloco de Esquerda, PCP, o Livre e o PAN juntaram-se para forçar a discussão da lei no parlamento, marcada para esta sexta-feira. O Governo acredita num entendimento com o PS.

O regime jurídico dos Instrumentos de gestão Territorial, badalado nas últimas semanas como a alteração à lei dos solos, tem sido alvo de fortes críticas de todos os quadrantes da sociedade.

Uma carta aberta, subscrita por mais de 600 especialistas e antigos políticos, alerta para os riscos para a agricultura, a floresta e o ordenamento do território.

O Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável também deu um parecer negativo ao diploma que alertou para os efeitos colaterais danosos, a nível urbanístico, ambiental, social e despesa pública. Considera que ainda assim não reúne condições para atingir o principal objetivo que é baixar o preço da habitação em Portugal.