Os debates eleitorais surgem nas televisões com a mesma fugacidade com que, ditos os soundbites e feitos os clips para as redes sociais, desaparecem. Para, depois, darem lugar a longas horas de comentário e avaliações sobre a prestação dos líderes partidários. E isso deve suscitar uma reflexão séria sobre a forma como queremos que o debate público aconteça — sobre o país, sobre o mundo e sobre o tempo no nosso tempo.

A aceleração na forma e nos ritmos dos conteúdos políticos obriga-nos, hoje, a tentar condensar em vinte segundos a complexidade de ideias e políticas públicas que levaram anos a pensar, estudar e que levarão ainda mais a executar. E, se é verdade que esta compressão do tempo político é adversa, também é verdade que, em certos contextos, é inevitável.

Vale a pena reconhecer o esforço que muitos atores políticos têm feito para se transformarem, num mundo mais veloz e menos tolerante com a pausa e com a dúvida. Os conteúdos digitais dos partidos mostram uma tentativa clara de adaptação, de aproximação às novas gerações, de comunicação mais direta e emocional. E isso é bom. É necessário. Porque uma política que não se adapta ao presente corre o risco de ficar presa a um passado que já não volta e já não existe.

No entanto, mais importante do que a política adaptar-se aos tempos é garantir que, nesse processo, não se desvirtua. A chave está — como quase sempre — no equilíbrio: entre a urgência e a reflexão, entre a forma e o conteúdo, entre a clareza e a complexidade. A política pode ser comunicada de forma mais eficaz sem deixar de ser exigente, sem deixar de ser verdadeira. Não podemos aceitar que a simplificação se transforme em simplismo.

É neste contexto que os debates televisivos se tornam o exemplo mais gritante daquilo que está a correr mal. O atual modelo de frente-a-frente, com tempo cronometrado ao segundo e temas comprimidos em segmentos de poucos minutos, matou por completo a possibilidade de discutir mais do que a superfície da superfície.

Hoje, em menos de meia hora, discute-se a crise da habitação, a guerra na Ucrânia, o crescimento económico, o estado do SNS, o aumento do investimento em defesa, a governabilidade, e muito mais, — sobrando ainda tempo para as habituais provocações e para um apelo ao voto útil ou ao voto consciente. Dão-se 13 minutos a cada líder para dizer como quer resolver tudo aquilo que o país não conseguiu resolver em décadas. Aceitar isto é admitir que os dramas nacionais que enfrentamos se resolvem com soluções simples e fáceis, e, nada poderia contribuir menos para a resolução dos problemas do que admitir esta falsidade.

É natural, então, que os candidatos entrem em estúdio não para debater com quem está à sua frente, mas para lançar de forma eficaz o soundbite preparado em casa, afinado com os assessores e pensado para circular nas redes, sem contexto e sem contraditório. Temos assistido não mais que a sprints de frases fortes e conclusões precoces. Não há espaço para um argumento seguir o seu curso, para escutar com atenção, hesitar com humildade, ou simplesmente explicar — com tempo! — aquilo que se propõe ao país.

É dramático — e não é exagero dizê-lo — que os debates sirvam mais para mobilizar claques do que para esclarecer cidadãos indecisos. Alimentam-se os já convertidos, empolam-se rivalidades e acentuam-se contrastes muitas vezes mais estilísticos do que políticos. E, mais, com isto tudo, afastam-se ainda mais os que já estão afastados da política. No fim de um debate, quem o vê fica a saber pouco mais do que já sabia antes sobre a proposta política dos dois partidos em confronto, mas fica pronto para assistir ao longo chorrilho de comentários e avaliações de 0 a 20 sobre a prestação dos líderes partidários.

É urgente que partidos e comunicação social reconheçam isto e tenham coragem de, para uma próxima eleição (cada vez mais recorrentes, infelizmente) repensar o modelo. O país precisa de debates que sejam verdadeiros momentos de confronto democrático. A televisão, ainda central na política, tem responsabilidade na saúde e qualidade do debate político. Se as empobrecer, empobrece a democracia.

Precisamos de criar condições para que o país se debata, mas debata mesmo, a fundo, com calma, com nuance, com dados e com seriedade. O espaço público está cada vez mais minado e armadilhado, e, por isso, é natural que falte a disponibilidade para se expor à fragilidade que o que proponho pode potenciar.

Só que se nada se fizer, se o país continuar sem se debater verdadeiramente, as consequências serão bem maiores do que as falhas que qualquer debate com tempo pode mostrar.