
A ONU anunciou que cerca de 400 pessoas morreram nos mais recentes ataques na região sudanesa do Darfur, que levaram também 60 a 80 mil famílias a fugir dos campos de deslocados, segundo a Organização Internacional para as Migrações.
Desde sexta-feira que o grupo paramilitar Forças de Apoio Rápido (RSF, na sigla em inglês) tem atacado a região do Darfur, na zona ocidental do Sudão, nomeadamente campos de refugiados.
"A nossa equipa sudanesa confirmou 148 mortos, mas este número está muito subestimado, uma vez que as nossas verificações estão em curso", disse à agência France-Presse (AFP) a porta-voz do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Ravina Shamdasani, que acrescentou que "fontes credíveis referiram mais de 400 mortos", sendo que o Governo sudanês já tinha estimado em 350 o número de mortos no domingo.
"Três dias depois de um ataque com drones e artilharia a Al-Fashir e ao campo de Abu Shouk, e um ataque a Zamzam [outro campo de deslocados], mais de 350 pessoas foram mortas e centenas ficaram feridas", disse domingo o ministro regional da Saúde de Darfur, Babaker Hamdin, numa conferência de imprensa em Porto Sudão (leste), transmitida pela televisão oficial.
O que se passa no Darfur, em grande parte controlado pelos paramilitares, é "um genocídio esquecido", enquanto "o mundo ignora estes graves crimes", acrescentou Hamdin.
Devidos aos ataques, entre 60.000 e 80.000 famílias fugiram do maior campo de deslocados internos do Sudão, em Zamzam, situado no Darfur, segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM).
A OIM disse, em comunicado, que entre domingo e hoje recebeu "múltiplos relatos de deslocações em grande escala do campo de deslocados internos de Zamzam", onde "entre 60.000 e 80.000 famílias" foram forçadas a abandonar o local "devido ao aumento da insegurança".
As RSF impuseram um cerco à zona em maio de 2024, que ainda está em curso e se intensifica, tornando quase impossível prestar ajuda humanitária à população de Al-Fashir e aos campos de deslocados internos nas mediações.
Segundo a investigadora Maram Mahdi e o investigador Moses Chrispus Okello do Instituto de Estudos de Segurança (ISS, na sigla em inglês), numa entrevista à Lusa, a região do Darfur pode ser o próximo "campo de batalha do conflito" e, consequentemente, a origem de um novo país.
De acordo com Mahdi, a região abrange cinco estados sudaneses e "tem uma importância no conflito que não pode ser subestimada".
As RSF controlam a maior parte do Darfur e, para a investigadora, "é provável que a região venha a ser a próxima fronteira e campo de batalha do conflito".
"As RSF capturaram algumas das capitais dos estados do Darfur logo no início da guerra, com exceção de Al-Fashir, mas os recentes ganhos na capital, Cartum, poderão incitá-las a expandir a sua expedição militar para oeste", declarou.
O investigador Moses Chrispus Okello explicou que o Darfur é etnicamente diferente do resto do país, constituído nomeadamente pelo povo Massalit, alegadamente alvo de genocídio por parte das RSF.
Com as RSF a prepararem-se para declarar um Governo paralelo no país, poderão existir, "no mínimo duas administrações a governar o Sudão", disse.
"Eu digo 'no mínimo', porque há grupos na zona do Darfur que manifestaram interesse numa separação", explicou.
O Alto Comissário para os Direitos Humanos, Volker Türk reagiu hoje dizendo que estes "ataques em grande escala evidenciaram o custo da inação da comunidade internacional, apesar dos repetidos "avisos sobre os riscos para os civis na região".
A Missão Internacional Independente de Averiguação das Nações Unidas para o Sudão também condenou os massacres, segundo um comunicado de imprensa do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos.
A guerra no Sudão, que começou em 15 de abril de 2023, matou dezenas de milhares de pessoas e obrigou mais de 12 milhões a fugir das suas casas e quase quatro milhões a procurarem refúgio nos países vizinhos.