
"A escola não pode limitar-se a transmitir conteúdos. Tem de preparar os alunos para a imprevisibilidade global, dar-lhes capacidade de adaptação e estimular a criatividade e o pensamento crítico." Quem o diz é Inês Oom de Sousa, que tem estado muito ativamente a liderar um movimento de transformação do ensino em Portugal, nomeadamente trazendo ao sistema de ensino experiências e iniciativas particularmente bem sucedidas, como o Aprender a Brincar - inspirada na Fundação Lego, usa jogos e brincadeiras para ajudar as crianças a desenvolver competências transversais, como a criatividade, a colaboração e a resolução de problemas - ou a Teach for Portugal, que em cinco anos conseguiu reduzir em 21% a taxa de negativas das turmas em que está presente, recorrendo a uma rede de mentores que trabalham com alunos, professores, escolas e autarquias e tem conseguido devolver a paixão por ensinar, enquanto ajuda crianças de contextos menos favorecidos a sonhar com um futuro melhor.
Para a presidente da Fundação Santander, se o ensino está hoje em grande parte desfasado das características e das necessidades das crianças, há pontos fundamentais em que se pode agir para alterar o panorama educativo, de forma a conseguir melhores resultados e alcançar resultados que potenciem o futuro dos mais novos. Logo à cabeça, estão os métodos de ensino. "É preciso capacitar os jovens para as competências do futuro: criatividade, capacidade de resolver problemas, comunicação e colaboração", diz ao SAPO, apontando que "estas competências são importantes para os jovens atuais e vão moldar as culturas das empresa no futuro" e frisando a importância enorme de apostar em competências emocionais — "trabalhar em equipa e ter empatia" é essencial.
Pedro Santa Clara concorda: "Educar para o futuro passa por inovar, incluir e envolver." Ao SAPO, o professor catedrático de Finanças da Nova SBE — que nos últimos anos tomou em mãos a missão de fundar escolas viradas para o futuro, como o conceito virado para a programação informática e aquisição de competências em software Escola 42 e os centros TUMO, direcionados para adolescentes e apostando numa nova experiência de aprendizagem onde se intersectam tecnologia e criatividade — lembra que vivemos tempos "desafiantes". "A educação, talvez o pilar mais determinante do nosso futuro coletivo, permanece ancorada em modelos obsoletos, incapazes de responder às exigências do século XXI. E o problema não é apenas pedagógico, é também social, cultural e político." Por isso, Pedro Santa Clara defende a necessidade urgente de "uma nova ambição para a escola – que tire partido da inovação tecnológica, promova a mobilidade social e o envolvimento ativo da sociedade civil".
A convicção do professor e antigo ministro da Educação Nuno Crato não está longe destas premissas. "Tudo indica que a qualidade da educação – não a sua quantidade – é importante fator de desenvolvimento. Passaram quase três décadas desde que essa descoberta estatística começou a ser evidenciada e sucessivamente confirmada. No entanto, muitos de nós ainda pensamos em termos de quantidade. Ficamos contentes com o aumento da escolarização – e é justo que isso se faça. Ficamos contentes por saber que há menos jovens a abandonar os estudos – e também é justo que isso aconteça. Mas poucas vezes pensamos na qualidade da educação."
Lembrando que "desde 2016 que todos os inquéritos internacionais aos conhecimentos e capacidades cognitivas dos nossos jovens mostram um declínio grave", piorado na pandemia, e tendo eles extremas dificuldades de leitura e em matemática, numa exposição ao SAPO, Nuno Crato aponta que as soluções têm de ir além das "coisas bonitas" que se dizem, como "tornar o ensino mais interessante, acelerar a digitalização, introduzir jogos nas escolas. Isso pode não fazer mal…, mas não vai resolver os problemas".
Inês Oom de Sousa, Nuno Crato e Pedro Santa Clara são três das vozes conhecedoras que vão subir a palco no dia 30 de maio, para partilhar uma nova visão para o ensino em Portugal. "Mobilizar ideias e inspirar o futuro" é o mote para a grande conferência Educação e Transformação, que a WinWorld promove no próximo dia 30 e de que o SAPO é parceiro e que conta com a Fundação MEO entre os founding fellows. Olhar os "desafios significativos" que enfrenta o sistema de ensino, e que "exigem atenção e ação imediata" são objetivos de um encontro que se faz para refletir e debater possíveis caminhos para a educação em Portugal, com parceiros de várias dimensões e valências, na Reitoria da Universidade Nova de Lisboa (pode acompanhar ao vivo ou através da transmissão online, aqui no SAPO).
"Enquanto as políticas públicas não regressarem a um tripé de medidas comprovadas, nomeadamente um currículo ambicioso, uma avaliação rigorosa e um apoio estruturados aos jovens com mais dificuldades, enquanto isso não acontecer, o progresso não se registará", sublinha Nuno Crato, explicando que a sua intervenção na conferência passará por aí. E é possível fazê-lo? "Sem dúvida! Foi o que fizemos desde princípio deste século até 2015, ano em que obtivemos os nossos melhores resultados de sempre nos inquéritos internacionais."
Para Pedro Santa Clara, uma aposta na inovação tecnológica não é mero sinónimo de adicionar tecnologia aos currículos educativos. "É preciso repensar o modelo pedagógico com aprendizagem ativa, prática e colaborativa, centrada nas competências humanas num mundo de IA." E é igualmente fundamenta trabalhar a inclusão, garantindo a "equidade através de ambientes de aprendizagem socialmente diversos e com recursos ajustados ao contexto de cada escola". "A educação não pode depender só do Estado. Projetos da sociedade civil já provam que é possível inovar com impacto — o desafio é torná-los regra, criando um ecossistema de cooperação, experimentação e escala."
"Um dos projetos que estamos a desenvolver na Fundação Santander é a colocação das mesas de criatividade nas escolas — que terão um manual prático que liga o currículo do 1.º ciclo a atividades nas mesas", junta, em declarações ao SAPO, Inês Oom de Sousa. "Para que todas as crianças tenham as mesmas oportunidades, independente do seu contacto socioeconómico; porque a criatividade foi considerada a competência mais importante no futuro no último relatório do PISA." Mas qualquer mudança que se queira imprimir no ensino tem de passar e envolver toda a comunidade, alerta, apontando a importância de atrair mais professores e capacitá-los para estes modelos. "Os professores têm de ser formados nestas novas metodologias. Não podemos estar apenas preocupados em cumprir o programa ou absorvidos em burocracia, enterrados em trabalho administrativo", diz. "Temos de ensinar novas competências e isso implica também libertar os professores para estarem mais tempo com os alunos, para se dedicarem a eles e às especificidades de cada um, e por fazer uma avaliação mais transparente do seu trabalho (nem todas as escolas dão feedback aos professores e alguns recebem a avaliação por correio registado!)."
O criador da Escola 42 e dos centros TUMO tem visão semelhante. "Embora Portugal tenha muito talento, as oportunidades continuam a estar distribuídas de forma desigual. A educação deve ser o principal instrumento para corrigir estas disparidades, mas isso exige uma transformação do sistema educativo, que também passa muito por as escolas terem autonomia efetiva para formar equipas, gerir os seus recursos e inovar com liberdade." "É igualmente essencial criar mecanismos de incentivo que valorizem o impacto e a qualidade do trabalho desenvolvido — e não apenas os resultados nos rankings", acrescenta Pedro Santa Clara.
Estes e outros temas do ensino para o futuro vão estar em debate na conferência Educação e Transformação, cujo desenho teve por base princípios de construção que partem de um "Elogio à Educação e Enaltecimento do Melhor que se Faz em Portugal (valorizar o esforço diário de professores, alunos, famílias e comunidades educativas que, com resiliência e criatividade, transformam desafios em oportunidades, contribuindo para uma educação mais inclusiva, significativa e adaptada às exigências do futuro)" para juntar os três grupos de atores diretamente envolvidos, professores, famílias e alunos, "alinhados e comprometidos com objetivos comuns".
Levar a palco o tema da educação através de uma Grande Conferência Nacional, moderna, agregadora e mobilizadora, que inspire a educação de hoje e de amanhã" é o objetivo assumido pela WinWorld e pelos parceiros desta iniciativa, com a organização a apontar um programa em que "cada painel, conversa ou apresentação visa gerar valor e promover conexões significativas". Veja aqui o programa completo e siga tudo em direto, na sala da Reitoria da Nova de Lisboa ou através do streaming, aqui no SAPO.