Ao contrário de João Costa, eu estive na conferência onde António José Seguro falou sobre a necessidade de reforçarmos as condições da governabilidade perante um parlamento cada vez mais fragmentado e polarizado onde, neste momento, é mais fácil construir maiorias negativas do que positivas.

António José Seguro defendeu que poderíamos avançar por duas vias: através de uma nova cultura política que valorize o compromisso como condição para resolver os graves problemas das pessoas, ou por normas legais. como mera sugestão, e repito mera sugestão, referiu que deveríamos discutir a possibilidade de que o orçamento só fosse chumbado se uma alternativa fosse apresentada. nem sequer chegou a formular isso como proposta.

Será importante, a este propósito, recordar que em alguns países existe ou existiu a figura da moção de censura construtiva como condição para a governabilidade. António José Seguro insiste na necessidade de, enquanto é tempo, debatermos com ponderação e seriedade o reforço das normas da governabilidade em nome de políticas públicas que respondam aos problemas das pessoas e não de medidas pontuais ou slogans vazios de gente anacronicamente obsoleta.

Foi nesse sentido que defendeu governos de projeto, e não governos de turno. discordar de meras sugestões é normal e útil em Democracia. aproveitar as sugestões, sem valorizar a necessidade do debate sobre as condições da governabilidade, já não faz qualquer sentido. muito menos faz sentido insinuar, com base nelas, que António José Seguro pretende diminuir as instituições da Democracia.

Como escreve Jürgen Habermas, "a Democracia não é apenas um sistema de governo, mas também um modo de vida que deve ser constantemente cultivado”. E, em tempos de incerteza, é fundamental que as nossas instituições se adaptem e fortifiquem promovendo o diálogo e a reflexão e foi nesse sentido que António José Seguro procedeu.

Recordo, aliás, que foi António José Seguro quem liderou a reforma mais relevante do parlamento em 50 anos de Democracia, dando-lhe alguma da centralidade perdida mas necessária (exemplo: debates quinzenais) e reforçando os poderes do parlamento na função de controle dos governos, temas que lhe são caros e que integram o seu campo de investigação académica.

Relembro que a erosão das instituições Democráticas está associada a casos de corrupção, promessas eleitorais não cumpridas e comportamentos menos éticos de responsáveis políticos. e manter tudo na mesma diminui, isso sim, a qualidade da Democracia e cria, como vimos nos últimos anos, espaços para os populismos e para os inimigos da Democracia.

Escrevo esta pequena reflexão em linha com o que ensinou Steiner, “a Democracia exige um espaço de diálogo e reflexão, onde as ideias possam florescer num ambiente de respeito mútuo”. Apenas assim poderemos garantir que as instituições Democráticas sejam fortalecidas e que as vozes dos cidadãos sejam verdadeiramente ouvidas.


Nuno Ferreira da Silva, militante do PS há mais de 35 anos.
Antigo chefe do gabinete do Grupo Parlamentar do PS